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quarta-feira, 5 de agosto de 2009

"Moscou" de Coutinho: documentário participativo ou meramente observativo?

Enfim, chega aos cinemas o 11º longa-metragem de Eduardo Coutinho, autor de "Cabra Marcado para Morrer" e “Edifício Master”. Trata-se de "Moscou", em que ele propõe outros “Jogos de cena”. O cineasta só tinha 21 dias para rodar um longa-metragem. Decidiu, então, documentar o que um grupo de teatro de larga experiência cênica e profissional poderia fazer com o texto teatral "As Três Irmãs" de Tchekhov, naquele período de três semanas. Para tanto, os atores só souberam qual seria o texto no primeiro dia de filmagens. Coutinho teve o cuidado de deixar claro que estava interessado naquela experiência e não numa montagem acabada. Queria observar o caminho e não a chegada em si.
Pode não ter sido exatamente esta a intenção do documentarista que, assim como em “O Fim e o Princípio”, não tinha uma idéia clara do que o filme iria se tornar. Mas é, de fato, tudo o que vemos em "Moscou”: a câmara praticamente se limita a acompanhar os mineiros do Grupo Galpão, fundado há 25 anos, nesta ocasião dirigidos por Henrique Diaz. (acima, com Coutinho)
O resultado é um apanhado de fragmentos dos workshops, laboratórios, improvisações e ensaios de uma peça que talvez nunca seja encenada e apresentada ao público. Nenhuma revelação ou olhar inusitado sobre a aventura da encenação dramática, da imitação poética da existência, ou da plasticidade da memória, como vimos em "Jogos de Cena" (2007). Quem esperar de "Moscou" um espetáculo daquele nível pode se decepcionar.

Na aparência e na essência, “Moscou” documenta o processo de trabalho do Grupo Galpão, em Belo Horizonte. O filme se limita a registrar as leituras e ensaios de "As Três Irmãs", de Tchekhov. Às vezes, essas práticas mostram surpreendentes, provavelmente para os que não se acham familiarizados com as rotinas de preparação dramática para o palco. Algumas falas ditas pelos atores olhando para a câmara parecem depoimentos ou entrevistas − que são recursos estilísticos e táticos típicos do gênero documentário. São, no entanto, apenas exercícios em que os intérpretes procuram elementos para construir os personagens dentro de seus estoques pessoais de lembrança afetivas. Mostram-se tão interessantes quanto podem ser os solfejos de aquecimento do mais talentoso dos tenores.
Na maioria das tomadas, nada acontece de intenso ou extraordinário. Parece que o cineasta evita manipular e interferir no que é filmado. E assim, toma uma atitude semelhante à metodologia original do cinema “direto”, inaugurado no final da década de 1950: a câmara se posiciona como “uma mosca na parede”, apenas observando e registrando, sem jamais interagir com o objeto, para que o espectador possa chegar às suas próprias conclusões. A experiência inicial dessa vertente foi "Les Racquetteurs" (foto acima), de Michel Brault, realizada no Canadá, em 1958: um filme de 17 minutos sobre uma convenção festiva típíca do Québec. Os participantes não precisam representar nada para a câmara, porque já estão “encenando” uns para os outros, desempenhando papéis estabelecidos pela tradição.

Se, de fato, foi essa a posição de Eduardo Coutinho, para ele “Moscou” é um verdadeiro regresso às origens. Como em 1960 ele estava estudando cinema em Paris, quando o antropólogo Jean Rouch lançava o seu "Crônicas de um Verão", é possível que ele tenha se encantado com a novidade do cinema "en directe". Em entrevista, Coutinho confessou que não tinha a menor idéia do que fazer com o material filmado e foi o produtor João Moreira Salles que deu uma forma à edição final: "Foi penoso olhar 70 horas de imagens em duas câmeras, fazer uma versão de quatro horas e depois de três meses de montagem ouvir pessoas dizendo que naquele material não havia um filme".

Moscou
Brasil - 2009 – 78 min
gênero documentário
distribuição Videofilmes
Direção Eduardo Coutinho
Com os integrantes do Grupo Galpão

Um comentário:

Bruno Mello Castanho disse...

Como vai meu caro?

Gosto muito de "Moscou" e arrisco dizer que Coutinho vai além sim de sua proposta em "Jogo de Cena". Em breve, escreverei também sobre o filme.

abraços

Bruno