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terça-feira, 29 de junho de 2010

"Vittorio De Sica - minha vida, meu amores" celebra o gênio e revela o homem

Quem gosta mesmo de cinema não deve perder o documentário “Vittorio De Sica – Minha Vida Meus Amores”, dirigido por Mario Canale, autor de obras sobre Marco Ferreri e Marcelo Mastroianni. A estrutura do filme é tradicional, iniciando-se com o que se chama de “escalada” precedendo a abertura, ou seja, uma seleção das frases mais marcantes de cada um dos entrevistados. Eles são muitos e importantes, como Woddy Allen, Kean Loach, Paul Mazursky, Mario Monicelli, Ettore Scola, Dario Fo, Sophia Loren, Clint Eastwood, Tonino Guerra, Shirley MacLaine, o crítico Leonard Maltin e até Federico Fellini.
O monumental cineasta que ajudou a transformar o cinema internacional como um dos criadores do neo-realismo italiano é mostrado em seus múltiplos aspectos: o ator, o cantor de cabaré, o cômico de teatro de revista e o diretor generoso que nunca ganhou um Oscar, ainda que o tenha embrulhado de presente para atrizes como Sophia Loren (“Duas Mulheres”, 1960).
Os filhos também são testemunha dessa generosidade e igualmente das suas manias domésticas, algumas até perversas, como a de obrigá-los a interpretar papéis de adultos nas festinhas de família. O filme atribui dimensão humana a certos mitos, contando que o neo-realismo (chamado pelo produtor Dino de Laurentis de “o cinema dos pobres”) só se manifestou por causa da falta de recursos. Filmava-se na rua com atores não-profissionais porque não havia como alugar estúdios e contratar estrelas. Foi aí que De Sica se destacou, por ter aprendido a não desperdiçar tempo e nem película, filmando tudo certinho logo na primeira tomada. O inglês Ken Loach observa que foi a primeira vez em que a classe proletária ganhava papéis de protagonista no cinema europeu. De Sica era admirado por todos. Tanto que o temido primeiro ministro Guido Andreotti de direita esbravejava contra ele – “na Itália não existem apenas ladrões de bicicletas” –, mas assim mesmo o respeitava.
Por outro lado, o documentário revela dados incômodos, como o vício do jogo, o perigoso calcanhar de Aquiles que o acompanhou por toda a vida e foi responsável por uma longa trajetória de dificuldades financeiras. Dependência que vimos transfigurada em autocrítica na comédia “Ouro de Nápoles” (1954) – exemplo perfeito de como ele nos sugeria levar a vida de um modo mais ligeiro e descompromissado. Mais polêmicos são os tapas que dava no rosto do garoto Enzo Staiola, para que ele chorasse pra valer diante das câmaras em “Ladrões de Bicicleta” (1948. A propósito, o roteirista Tonino Guerra o define como um diretor que conduzia tudo com “uma mão mais leve e… mais alta”.

VITTORIO DE SICA – MINHA VIDA, MEUS AMORES
Vittorio D
estreia 02 de julho 2010
Itália, 2009, 92 min, livre.
Gênero Documentário
Distribuição Art Filmes
Direção Mario Canale
COTAÇÃO
* * * *
ÓTIMO

quarta-feira, 23 de junho de 2010

"Kick-Ass": sucesso nos quadrinhos, chega aos cinemas quebrando tudo

A idéia central de KICK ASS – QUEBRANDO TUDO está contida no livro pretensamente científico de Fredric Wertham chamado “A Sedução dos Inocentes”, publicado em 1954 e que quase derrubou a indústria dos comics. Ele supunha o perigo de que um garoto pudesse se vestir como o Capitão Marvel, gritar Shazam e se lançar pelos ares. É quase isso o que acontece no filme, quando um estudante (com mesma idade do Homem Aranha) se veste de herói mascarado e sai pela noite para combater os criminosos, armado apenas de um porrete.
Ele sabe que super poderes não existem e, mesmo assim, quer mudar de vida e sair do anonimato. Mas ele se engana, porque super poderes existem sim e geralmente estão a serviço dos vilões. O mais forte de todos é o dinheiro e contra isso, somente a vingança e a loucura que ela costuma provocar podem ter algum efeito. Por uma coincidência própria das graphic novels, o nosso quase herói pisa no calo do mais rico traficante de Nova York e precisa se associar a uma dupla de vigilantes que quer destruí-lo.

Essa dupla é formada por uma menina de 9 anos e seu pai, um ex-policial vivido por Nicholas Cage: uma improvável mistura de Batman e Justiceiro, ambos raras exceções de heróis vingativos e desprovidos habilidades físicas excepcionais. Como se vê, o filme não é para ser levado muito a sério, mas representa o grito de insatisfação de toda uma geração de jovens que preferia estar quebrado a cara dos bandidos da vizinhança a morrer no Iraque ou no Afganistão. KICK ASS se baseia numa bem sucedida HQ de Mark Millar, o mesmo criador do excelente “O Procurado”, que já virou filme com Angelina Jolie.

KICK ASS – QUEBRANDO TUDO
Kick-Ass
estreia 18 06 2010
EUA – 2010 – 118 min. – 18 anos
Gênero Ação / Aventura
Distribuição Paramount
Direção Matthew Vaughn
Com Aaron Johnson, Nicolas Cage,
Clark Duke, Lyndsy Fonseca
COTAÇÃO:
***
B O M

domingo, 20 de junho de 2010

“A Jovem Rainha Vitória”: um processo político com precisão de documentário

Numa passagem central de “A Jovem Rainha Vitória” um longo travelling mostra Emily Blunt no papel de Vitória, entrando no recinto do Conselho para a sua primeira aparição como rainha. A câmera a segue, filmando a sala por cima do ombro da monarca e caminhando em direção a um imenso espelho no fundo da sala. Quando ela para, de costas para o espelho, a câmara passa na frente dele e, mesmo assim, não a vemos. A cena pode ser vista como referência à célebre tomada em que Richard Leacock filmou John Kennedy subindo a um palco em “Primárias” (1960) – um dos documentários seminais do cinema direto. É como se o diretor Jean-Marc Vallée nos dissesse: “estamos fazendo um filme de ficção, mas a proposta aqui é apenas reproduzir o fato histórico, sem tentar qualquer interpretação sobre ele”. De fato, o parentesco cinematográfico mais íntimo de “A Jovem Rainha Vitória” é com “A Tomada do Poder por Luis XIV”, filme que Roberto Rosselini fez em 1966 e que só agora é lançado em sua versão original no Brasil (em DVD pela Versátil). A TV Cultura mostrou várias vezes uma cópia em branco e preto, por que o título foi produzido para a televisão italiana, numa época em que nem todas as emissoras transmitiam a cores. Além isso, os aparelhos coloridos de TV eram naquele tempo um luxo que só a elite podia pagar. Ao lado de “A Batalha de Culloden” (1964) do inglês Peter Watkins, “A Tomada do Poder por Luis XIV” de Rosselini foi obra fundadora do “docudrama” – uma palavra cunhada pelo próprio Watkins.
Esta expressão vem recebendo diversas definições (incluindo a dele mesmo), mas procuro entendê-la como referente àquele tipo de drama que se constrói tão somente de fatos documentados. Ou seja, isento, ou pelo menos econômico, em matéria de elementos ficcionais desenvolvidos em torno de personagens (do filme e também da chamada “vida real”). Principalmente quando ocupem posição de protagonismo nos acontecimentos históricos incluídos no enredo. E em especial nos aspectos essenciais para a estrutura da sua caracterização. Assim, por exemplo, é possível inventar a maneira como aquela rainha da Inglaterra dançava a valsa, mas não o seu compositor favorito ou o seu partido predileto – dados, aliás, bastante precisos em sua biografia. Mas pode-se imaginar o colorido de seus vestidos, até porque em meados do século XIX a fotografia ainda não possuía cores.
A propósito, Andy Powell ganhou o seu 3º Oscar de Melhor Figurino com este trabalho. Os outros foram “O Aviador” e “Shakespeare Apaixonado”. O profissional de maior responsabilidade dentro da equipe, entretanto, foi o roteirista Julian Fellowes − premiado com o Oscar pelo texto de “Gosford Park (2001) dirigido por Robert Altman. Com todo o ascetismo ficcional que o gênero docudrama solicita, ele elabora uma trama de conflitos que se restringem praticamente por inteiro à esfera política. Com isso, os personagens de primeira grandeza no palco da história, como foram a Rainha Vitória e seu marido, não se revelam aqui em termos de conflitos internos. Deles nada sabemos quanto a possíveis dúvidas, frustrações, temores ou angústias. Das intenções, só se explicita a de conquistar e manter-se no exercício do poder, junto com tudo ao que a este objetivo se ache conectado. É caso, por exemplo, das bandeiras políticas de proteção às artes e de amparo aos mais humildes. E, na verdade, do próprio “romance” que une os dois jovens monarcas: um relacionamento de amor em que os namorados só se conversam por meio de cartas antes de se casarem.
É preciso reconhecer a dificuldade de redigir uma trama minimamente interessante com toda essa limitação e, ainda por cima, tornar plausível a possibilidade (somente insinuada) de que a herdeira do trono britânico se achasse realmente apaixonada pelo príncipe Albert quando o escolheu como noivo. Ainda mais quando, entre os produtores constam os nomes de Martin Scorcese e de Sarah Ferguson, produtora de cinema que foi casada com o príncipe Andrew e, portanto, nora da Rainha Elizabeth, descendente de Vitória. Mas o filme brilha em sua suave nobreza, não só pelo figurino, mas pela direção de arte como um todo, e pelo trabalho dos atores como Jim Broadbent, no papel do rei Guilherme IV e Miranda Richardson como a Duquesa de Kent. Justiça seja feita também à direção de Jean-Marc Vallée, por ter fabricado imagens de impacto, como a sequência do jantar no castelo de Windsor.
A JOVEM RAINHA VITÓRIA
The Young Victoria
Reino Unido/ EUA – 2009 – 105 min. - 10 anos
estréia 18 06 2010
Gênero Docudrama / História / Política
Distribuição: Europa Filmes
Direção Jean-Marc Vallée
Com Emily Blunt, Miranda Richardson,
Jim Broadbent, Rupert Friend e Paul Bettany
C O T A Ç Ã O
* * *
B O M

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Com "O Profeta", de Jacques Audiard retoma a vigorosa tradição do policial francês

O Profeta” é um filme francês que quase ganhou a Palma de Ouro e o Oscar de filme estrangeiro em 2010. É de fato um excelente trabalho de Jacques Audiard sobre um jovem delinqüente de origem argelina (Tahar Rahim), iniciante e analfabeto que se transforma em chefão dos traficantes parisiense. Isso praticamente sem sair da cadeia, onde cumpre pena de seis anos – tempo suficiente para completar o curso de graduação e doutorado em matéria de crime organizado. Não é uma história na linha de “Cidade de Deus”, mas o diretor Jacques Audiard declara que se inspirou na forma como Hector Babenco fez “Pixote” e “Carandiru”. Aqui as questões étnicas e sociais aparecem apenas como pano de fundo, porque o drama é construído em torno da figura do protagonista, um presidiário pé de chinelo que vai subindo na hierarquia criminosa da prisão, apoiado apenas numa incansável capacidade de lutar pela sobrevivência associada à total ausência de princípios morais − um verdadeiro animal político como descreveu Maquiavel. No começo, o filme quase se confunde com um documentário, descrevendo friamente o ambiente infernal do presídio que parece mais limpo e organizado que os brasileiros, mas acaba se mostrando até mais cruel. Aos poucos a ação vai esquentando e o ritmo dos acontecimentos se mostra tão envolvente que o filme chegou a ser atacado por alguns críticos franceses por telo considerado um mero seguidor dos modelos americanos. Engano total, porque “O Profeta” é único em seu estilo: feito de suspense, humor negro e até determinados elementos fantásticos que têm a ver com o título. É notável, por exemplo, a maneira irônica como ele usa a música, que vai comentando as peripécias do herói.
O núcleo da narrativa é um processo de ascensão política no qual o bandido novato é “protegido” pelo veterano líder da máfia dos corsos. Interpretado pelo nórdico Niels Arestrup, sem dúvida o melhor ator em cena, este personagem traz uma carga trágica que o aproxima de Don Corleone criado por Marlon Brando para “O Chefão”. A competência da direção fica evidenciada pela proeza de tornar plausível uma transformação tão radical como a que assistimos na trajetória da figura central e manter a ação dramática se intensificando sem cessar, praticamente dentro dos muros de um presídio.
O PROFETA
Un Prophète
França/ Itália - 2009 – 155 min. - 18 anos
estreia 18 06 2010
Gênero Drama / Policial
Distribuição Columbia
Direção Jacques Audiard
Com Tahar Rahim, Niels Arestrup e Adel Bencherif
COTAÇÃO
* * * *
ÓTIMO

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Ainda há tempo de ver o eletrizante “Os Homens Que Não Amavam as Mulheres”

Um dos filmes mais interessantes lançados até agora em 2010 é “Os Homens Que Não Amavam as Mulheres” (Män som hatar kvinnor), adaptação cinematográfica do primeiro episódio da chamada “trilogia Millennium”, escrita pelo pelo jornalista sueco Stieg Larsson -- um talento literário que morreu em 2004, com apenas 50 anos. De 2005 até agora, a série foi lançada em 40 países e vendeu mais de 20 milhões de exemplares. Já o filme foi visto por 8 milhões de pessoas na Europa. E em todo o mundo, foi a terceira mais bem sucedida produção, em língua não-inglesa de 2009. Os outros dois títulos da coleção também já foram filmados e os direitos da primeira parte foram adquiridos pela Columbia Pictures. Em 2012, a versão americana deverá estar pronta, com direção do prestigiado David Fincher ("O Curioso Caso de Banjamin Button"). Apesar de competente, a dupla original de protagonistas, Michael Nykvist e Noomi Rapace, não têm a marca fisionômica de Hollywood e há comentários de que serão substituídos – ele por George Clooney, ou Johnny Depp ou, Vigo Mortensen e ela pela emergente Carey Mulligan ("Educação").

Uma apreciação inicial da extrema qualidade que o filme apresenta pode ser resumida na seguinte formulação “fast food”: uma mistura de Bergman com Hitchcock. Ou seja, suspense de alta voltagem montado a partir de personagens e situações aprofundados e ancorados na concretude dos mundos psíquico e social em que vivemos. O personagem central é um jornalista injustamente preso e condenado por difamação. Para dar plausibilidade a essa circunstância num país como a Suécia, o escritor criou uma engenhosa armadilha armada por um político neofascista. Impedido de trabalhar na mídia, ele é contratado para investigar o desaparecimento da sobrinha de um magnata que vive recluso numa ilha.
Há inicialmente uma homenagem a "Blow Up" (de Michelangelo Antonioni - 1967), numa fase em que o herói aplica as técnicas jornalísticas tradicionais (e analógicas), vasculhando arquivos e dissecando documentos. Mas quando entra em cena a intrigante figura de Lisbeth, uma hacker profissional que se associa a ele, o filme entoa uma espécie de ode à internet e aos procedimentos digitais de pesquisa. Um dos encantos do filme, aliás, é esse confronto entre personalidades formadas por duas culturas quase antagônicas, que teria tudo para cair no lugar comum das comédias americanas em que homem e mulher se odeiam a princípio e, depois, se amam. A título de “teaser”, adiantamos que essa moça é uma jovem punk e lésbica que se acha em liberdade condicional por ter incendiado (literalmente) o homem que a molestara na infância. E os motivos que a levam a se juntar ao repórter se mostram especialmente apavorantes.
O horror verdadeiro, porém, vai se adensando à medida que eles se aproximam dos suspeitos e vão reconstituindo uma série de outros crimes até então não resolvidos. E nesse ponto, o texto de Stieg Larsson esbanja ironia, porque esses assassinatos são cometidos por um ex-militante nazista que mata mulheres conforme determinadas execuções e cenas de violência descritas no antigo testamento. Enfim, “Os Homens Que Não Amavam as Mulheres” e o “upgrade” que realiza nesse gênero de espetáculo que, até agora, só tinha chegado ao nível de “O Silêncio dos Inocentes” (de Jonathan Demme – 1991) é uma surpresa mais que bem-vinda. O cinema feito em Hollywood já provou também possuir vida inteligente, mas agora, não há dúvida que o cinema sueco esbanja inteligência emocional.
Os Homens Que Não Amavam as Mulheres
Män som hatar kvinnor
Suécia - 2009 - 16 anos
estreia 21 05 2010
Gênero suspense / crime
Distribuição Imagem
Direção Niels Arden Oplev
Com Michael Nykvist Peter Haber e Noomi Rapace
COTAÇÃO
****
ÓTIMO

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Indispensável! Mostra "Cinema de Moda" na Galeria Olido, de 8 a 16 de junho.

Entre os dias 8 e 18 de junho, a Galeria Olido oferece uma mostra de 15 filmes que se referem às ligações entre a moda e o cinema. Sempre com entrada franca, a cada dia serão exibidos dois filmes, às 15:30hs e 18:30hs. A convite da Galeria Central e da Galeria Pontes que organizam este evento paralelo ao São Paulo Fashion Week, um grupo bem diversificado de personalidades indicou os títulos. Gente como Constanza Pascolato, Cesar Giobbi, João Braga e José Gayegos escolheu o filme de sua preferência. Como resultado, obteve-se uma lista que contempla diversos gêneros, épocas, estilos e nacionalidades, num leque extremamente variado e significativo das múltiplas conexões entre os universos da moda e do cinema.
YVES SAINT LAURENT - O TEMPO REDESCOBERTO (dia 8/6) é um documentário escrito e dirigido por David Teboul, um especialista em história da moda francesa que usa o cinema como meio de investigação e expressão. Ele já contou, por exemplo, a trajetória da Revista Elle e abordou a vida do estilista Yves Saint Laurent em dois filmes feitos em 2002. Um deles é este O Tempo Redescoberto,cujo principal elemento é uma longa entrevista com aquele designer argelino radicado em Paris, onde morreu em 2008, com 72 anos de idade. E que também fez cinema, assinando figurinos de clássicos como “Viver a Vida” (67) de Claude Lelouch.
Neste OS EMBALOS DE SÁBADO NOITE (dia 8/6) de John Badham, feito em 1977, John Travolta criou Tony Manero − uma figura tão expressiva que voltou em 1983, com “Os Embalos de Sábado Continuam”, dirigido por Sylvester Stallone. E novamente em 2008, num drama do chileno Pablo Larain e que atesta a difusão daquele ícone pelo mundo inteiro. Um personagem que marcou tanto pelo gestual da sua dança, quanto pelo modo de se apresentar e de se vestir: uma espécie de síntese visual de uma determinada vertente dos anos 70.
GIGOLÔ AMERICANO (dia 9/6) Se John Travolta carimbou os anos 70 com os exageros visuais de seu personagem Tony Manero, de “Saturday Night Fever”, Richard Gere abriu os anos 80, com a discrição de Julian, protagonista de “O Gigolo Americano” com direção de Paul Schrader em 1980. Talvez você não se recorde de outro filme dirigido por Schrader. Mas, certamente deve se lembrar de “Taxi Driver” e de “ A Última Tentação de Cristo” -- filmes que ele trabalhou apenas como roteirista. Aqui Schrader resolveu chamar Giorgio Armani para vestir o seu personagem para, assim, diferenciá-lo de todos os demais. A idéia deu tão certo que esse estilista italiano foi chamado para colaborar em outros 22 filmes.
Em 1985, Out of Africa, o título original de “Entre Dois Amores” (dia 9/6) ganhou 7 Oscars. Entre eles não estavam incluídos o de Melhor Atriz para Meryl Streep e nem o de Melhor figurino para Milena Canonero. Muita gente disse que isso foi injustiça em dobro. Se essa queixa era procedente, ou não, basta verificar que hoje, passados 25 anos, Meryl Streep acumula 14 indicações 3 Oscar recebidos. Por sua vez Milena Canonero também conquistou três Oscars, sendo o mais recente o polêmico Maria Antonieta, dirigido por Sofia Coppola. Uma carreira, portanto, em que predominam os filmes de época, nos quais o estilista tem a dupla missão de pesquisar a história e criar um look para cada personagem.
Além de surpreendente, a escolha de “O Belo Brummel” (dia 10/6), de 1954, para esta mostra é mais do que adequada, porque o filme fala de um herói real, mas pouco conhecido. Brummel era um militar dandy, que ditava a moda na Inglaterra no início do século 19. Um personagem que, além de elegante, era bom de briga e um severo crítico dos poderosos. O elenco era liderado por Elizabeth Taylor e Stewart Granger, uma dupla de artistas ingleses visualmente impressionante, contracenando com o craque Peter Ustinov. O diretor era o alemão Curtis Bernhardt, um mestre que fugiu do nazismo e veio para Hollywood nos anos 30. Confesso que este filme que eu vi quando tinha 9 anos, foi um dos responsáveis pelo meu interesse pelo cinema, que permanece até hoje. Cheguei a fazer aulas de esgrima, porque queria ser um espadachim, como o herói. Isso não deu certo, mas, em compensação me tornei um crítico assim como ele era.
Depois daquele Beijo (dia 10/6) “Blow Up” (66) é a obra de Antonioni que mais profundamente discute a cultura e a comunicação do tempo em que foi feita, ou seja, os anos 60. O protagonista é um fotógrafo de moda vivido por David Hemmings, contracenando com divas como Vanessa Redgrave, Jane Birkin e Sarah Miles. O filme, aliás, colaborou para a excessiva glamorização desse ofício que aconteceu em seguida. Mas, na verdade o que ele questiona é o império das imagens sobre a vida real, ou da aparência sobre a essência. No centro da trama, temos um assassinato que é registrado por acaso numa sessão de fotos. É sem dúvida um dos títulos mais importantes na carreira de Antonioni e de todo o século 20.
De 1954, “Sabrina” (dia 11/6)é uma trama escrita e dirigida por Billy Wilder, o genial mestre da comédia sofisticada -- um daqueles cineastas europeus que, fugindo do nazismo, veio elevar o nível artístico e intelectual do cinema americano em meados dos anos 30. De certa maneira, esta história protagonizada pela elegantíssima Audrey Hepburn fala também de um processo civilizatório. Assim como na trajetória do Patinho Feio, ela faz o papel da filha de um motorista que é apaixonada por um dos filhos de seus patrões e que, é claro, não liga a mínima pra ela. Mas depois que a moça regressa de uma viagem à França, burilada pela cultura européia, a coisa muda totalmente de figura.
ZUZU ANGEL (dia 11/6) foi uma estilista carioca que antes de ser tema de filme, foi eternizada pela canção de Chico Buarque de Holanda, na qual ele resume o drama de Zuzu Angel, uma heroína brasileira dos tempos da ditadura. A pergunta do compositor (Quem é esta mulher?) é respondida pelo diretor Sergio Rezende ao descrever a saga desta mãe que teve o filho envolvido na luta armada contra o regime e que foi assassinado nos porões da ditadura.Só que antes de ter certeza disso, ele viveu uma dolorosa peregrinação em busca do filho desaparecido. A direção de arte de Marcos Flaksman nos remete por inteiro aos anos 70. Os estudiosos e especialistas em moda aqui presentes poderão avaliar se o figurino de Kika Lopes é mesmo fiel à época, ou se comete alguns exageros ao recriar a atmosfera estilística de um período marcado justamente pelos exageros. Como eu digo no meu livro, o filme traz surpresas, como Luana Piovani, interpretando Elke Maravilha, que era a melhor amiga da protagonista.
ROMA DE FELLINI (dia 12/6) não tem um enredo, porque é feito de diversos segmentos independentes de um ensaio cinematográfico sobre a cidade. É um retrato a um só tempo barroco e impressionista de Roma a partir do ponto de vista de um dos seus cidadãos mais famosos. Tem elementos de autobiografia porque reconstitui a chegada Fellini a Roma, durante a ditadura de Mussolini. Mas também mostra cenas da vida romana na atualidade, como um tremendo engarrafamento de tráfego. Destacam-se dois símbolos fortíssimos da dualidade dessa metrópole contemporânea e atemporal: uma equipe arqueológica na escavação do metrô e um incrível desfile de moda eclesiástica. Pois é, veremos batinas, sotainas, tonsuras e paramentos desfilando na passarela...
PULP FICTION - TEMPO DE VIOLÊNCIA (12/6) Bizarro, cômico, caricatural, agressivo e irônico. Esses são apenas alguns dos adjetivos que podem ser atribuídos a PULP FICTION - TEMPO DE VIOLÊNCIA, este notável filme de Quentin Tarantino, feito em 1994. Uma síntese bem humorada da cultura pop na década anterior, que não esconde o desejo de trazer para os andares superiores da criação artística, determinaoselementos até então condenados aos porões da indústria cultural, como as histórias em quadrinhos, as séries policiais classe C de televisão e a música barata das discotecas. Um exercício de fusão que indicou novos estilos, não apenas para a moda, mas para o próprio cinema.
Um dos últimos filmes da excepcional carreira de Luchino Visconti, “Morte em Veneza” (13/6)é a destilação máxima da elegância visual e da intensidade dramática que sempre mercaram o cinema do cineasta italiano. Baseado numa novela de Thomas Mann, e por meio de um protagonista que é um compositor de vanguarda no tempo da belle époque, o filme aproxima magistralmente duas forças contraditórias, ou seja, o fascínio pela beleza e o impulso da auto-aniquilação. Dificilmente Visconti conseguiria a mesma excelência de resultados, sem a participação de Piero Tosi, o figurinista de praticamente todos os seus filmes. Muitos deles de época, como Ludwig e O Leopardo. Como se sabe, nesse tipo de espetáculo, o estilista tem a dupla missão de pesquisar a história e criar um look para cada personagem.
FOME DE VIVER (13/6) é uma peça fundamental na filmografia de Tony Scott, irmão do célebre Ridley Scott, ainda que tenha sido injustamente acusada de formalista e excessivamente rebuscada do ponto de vista visual. Conta uma história de vampiros especialmente refinada, e considerada uma das fundadoras do estilo “neo-gótico” com um elenco cuja química surpreendeu, ou seja, David Bowie, Catherine Deneuve e Susan Sarandon. Realizada em 1983, a produção conta com a excelência de Milena Canonero no design dos figurinos. Ela, uma veterana detentora de 3 Oscars, e que se destaca tanto nos espetáculos de época, como Barry Lindon, quanto nos filmes fantásticos como “Laranja Mecânica”, só para citar dois trabalhos que ela fez com o falecido mestre Stanley Kubrick.
Dirigido pelo documentarista holandês Femke Wolting SNEAKERS (dia 14/6)aborda o sapato como uma expressão cultural, uma espécie de ícone dos tempos modernos. A idéia central do filme é que o tênis seja muito mais do que apenas um tipo de calçado, mas também expresse uma tendência nos usos e costumes como um todo. Uma peça de vestuário carregada de uma simbologia tão rica e variada que ultrapassa a sua função utilitária. O filme mostra a sua evolução histórica a partir do primeiro All Star até as mais recentes inovações tecnológicas. É sem duvida, um dos grandes cases de marketing no mundo contemporâneo.
Feito em 1999, CLUBE DA LUTA é (dia 14/6) dirigido por David Fincher, atualmente consagrado por títulos como “O Curioso Caso de Benjamim Button”. CLUBE DA LUTA é protagonizado por Edward Norton, Brad Pit e Helena Bonham Carter. Norton representa um "homem comum" descontente com sua posição de classe média. Com um vendedor de sabonetes interpretado por Pitt, ele forma um "clube de combate" dedicado a uma atividade extremanente violenta. Aqui, a intenção de Fincher é usar a violência como metáfora do conflito entre uma geração de jovens e o sistema de valores do capitalismo consumista. Os executivos do estúdio Fox não gostaram do filme e não conseguiram divulgá-lo a contento. Por isso, ele não obteve boas bilheteiras e dividiu a avaliação dos críticos, que o viram ora como o prenúncio des mudanças no quadro político americano, ora como simplesmente uma produção de estilo visual inovador. No entanto, o filme tornou-se um sucesso comercial com o lançamento em DVD, que consagrou CLUBE DA LUTA como um film cult. Talvez o designer Michael Kaplan, que foi também criador dos figurinos de “Blade Runer”, seja um dos responsáveis por essa virada.
Realizado por Wim Wenders em 1989, IDENTIDADE DE NÓS MESMOS (dia 15/6) é um documentário feito por encomenda para o Centro Georges Pompidou em Paris, sobre o trabalho do estilista japonês Yoji Yamamoto. Wenders que vinha de uma Palma de Ouro em Cannes (Paris Texas – 1984) recebera a incumbência de abordar o mundo da moda. Mas na narração inicial que abre o filme, ele confessa um desprezo por essa atividade que, naquele final dos anos 80, era ainda generalizado no ambiente do cinema. Ele declarava: “Me interesso pelo mundo, não pela moda”. Mas ao longo do filme ele foi se surpreendendo com o trabalho criativo de Yamamoto e literalmente se apaixonando pelas câmaras de vídeo que começava a usar experimentalmente, neste filme, junto com as máquinas de filmar tradicionais. Trata-se, portanto, do registro artístico de uma dupla descoberta por parte do cineasta que nos apresentou obras memoráveis, como Buena Vista Social Club.
Faltava um musical nesta mostra de filmes e a escolha de MY FAIR LADY – MINHA BELA DAMA (dia 15/6) nos traz um dos mais ricos, sob todos os pontos de vista. Em 1964, George Cukor dirigiu a versão para o cinema de um musical da Broadway criado por Alan Jay Lerner e Frederick Loewe, a partir da peça Pigmaleão de George Bernard Shaw. No elenco, Audrey Hepburn e Rex Harrison. Nos figurinos, o veterano Cecil Beaton, que já tinha brilhado com Gigi, em 1958. MY FAIR LADY foi o musical de maior sucesso e que permaneceu mais tempo em cartaz em toda a história. Talvez aí esteja o interesse em discutir esse filme no contexto da moda, que às vezes é definida pela sua transitoriedade. Se for verdade que a moda seja essencialmente passageira, como avaliar a importância de obras com tamanha durabilidade e tanta permanência ao longo do tempo. Ou seja, como se explica a existências de coisas e valores que nunca se colocam foram de moda?