Encontre o que precisa buscando por aqui. Por exemplo: digite o título do filme que quer pesquisar

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

A partir de hoje vamos publicar a cada semana uma nota sobre as estreias em São Paulo


Cinco filmes são as opções de estreias nos cinemas desta semana. É raro, mas nesta leva predomina o cinema francês, com o filme de maior bilheteria na história da França que é INTOCÁVEIS. Nada a ver com o homônimo americano do Brian de Palma. Conta a história de um milionário que fica paraplégico e contrata um acompanhante que nada tem a ver com ele. Bom, já se fez milhares de comédias aproveitando esse tema das desavenças pessoais que viram amizade. Vamos conferir...
 Mas, com toda a certeza a outra produção francesa que estreia A REBELIÃO (foto acima), é um dos grandes filmes do momento. Na linha do docudrama de suspense, é escrito, dirigido e interpretado por Mathieu Kassovtiz, narrando um dos acontecimentos políticos mais complicados da história daquele país, que foi a revolta da Nova Caledônia ocorrida em 1988, durante o governo Mitterand.
Sabendo que um meteoro vai se chocar contra a Terra um homem sai em busca de uma antiga namorada. Esse é o tema da comédia PROCURA-SE UM AMIGO PARA O FIM DO MUNDO, com Steve Carell. Um assunto meio complicado para o humorismo, principalmente quando se lembra do drama Melancolia de Lars Von Trier.
Outra comédia com tema meio sinistro é a produção brasileira de baixo orçamento UM HOMEM QUALQUER (foto abaixo) sobre um desempregado que resolve se tornar criminoso. O elenco é bom: Carlos Vereza, Eriberto Leão e o craque Norival Rizzo. E finalmente há também a pancadaria de OS MERCENÁRIOS 2, com Sylvester Stallone sua turma que agora inclui o Arnold Schwarzenegger. 

A comédia "O ditador" Sacha Cohen não é tão boba e superficial quanto pode parecer


Em “O ditador”, Sacha Baron Cohen modifica o estilo de comédia que vinha oferecendo em filmes anteriores como “Borat” (2006) e “Bruno” (2009), ou seja, a linha do falso documentário, em que pessoas comuns e inocentes, quase sempre amadores, eram atraídas para contracenar com ele em centenas de pegadinhas de mau gosto. Desta vez ele faz piada com a figura do déspota General Aladeen, um ditador atual que representa uma paródia-síntese de personagens reais, numa mistura em que prevalece o estilo truculento e cruel de Idi Amim, Kadafi e Assad, temperada por uma barba tipo Bin Laden. Apesar da grossura geralmente escatológica da maioria das gags, o filme é de fato engraçado, principalmente pelo cuidado com que ele constrói a sua criatura, mais ou menos como Chico Anísio fazia com seus personagens. Ou seja, dotando-lhes de uma palpável credibilidade que vinha da coerência entre os diversos elementos com os quais eram elaborados: o gestual, a voz, o sotaque e a maneira de se expressar, por exemplo, tinham tudo a ver com o seu modo de agir, de andar e de se vestir. 
Mesmo quando o pomposo Aladeen se achava despido daquele uniforme branco e ridículo com o qual Sacha tentou assistir a última cerimônia do Oscar. Na ocasião, aliás, ele foi barrado, porque a Academia concluiu (com razão) que aquela atitude seria uma ação promocional para o filme. Além disso, ele decidiu contratar intérpretes profissionais, investindo assim no desenvolvimento de “escadas”, isto é, de personagens auxiliares, ou coadjuvantes, que lhe servem de contraponto -- como um físico nuclear (Jason Mantzoukas), uma ativista ecológica (Anna Faris) e um tio (Ben Kingsley) que planeja tomar o poder e instaurar uma “democracia, corrupta como as ocidentais”. Apesar de também desenhar a caricatura de um tirano, o filme tem pouco a ver com seu quase homônimo (O Grande ditador - 1940), obra de Charles Chaplin. Mas, ambos incluem em sua parte final um discurso calcado na lógica do absurdo. 
Enquanto o de Chaplin elaborava uma língua esdrúxula, o de Sacha injeta uma alta dose de ironia, voltando a mira de seu canhão satírico para o sistema americano, ao fazer a defesa de seu próprio regime antidemocrático: “Imaginem se a América fosse uma ditadura... Vocês poderiam ignorar as necessidades dos pobres em termos de educação e saúde. Poderiam grampear telefones... Torturar prisioneiros estrangeiros. Ou mesmo mentir para justificar uma guerra. Encher as prisões de um grupo racial em particular que ninguém iria reclamar. Ou usar a mídia para assustar a população até que ela apoie políticas contrárias a seus próprios interesses”. A comicidade de Sacha pode não ser elegante como a de Tati, nem refinada como a de Chaplin, mas, certamente também não é boba.
O DITADOR 

The Dictator 
EUA, 2012, 94 min, 14 anos.
estreia 24 08 2012
gênero comédia / política
Distribuição Paramount Pictures 
Direção Larry Charles 
Com Sacha Baron Cohen, Anna Faris, Ben Kingsley
COTAÇÃO
***
BOM


segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Segue em cartaz "360", o belo filme globalizado de Fernando Meirelles. Vale conferir.


Como sabemos, “360” é a adaptação de um texto teatral do austríaco Athur Schnitzler (1862-1931) que, em 1950, já tinha sido filmado por Max Ophuls (1902-1957), como o nome de “La Ronde”. Era um enredo que não tinha um único núcleo dramático, mas uma série deles, que se transferiam de um personagem para outro, todos ligados factualmente entre si, até que o último coincidisse com o primeiro, como que fechando um círculo. O autor se inspirou numa rua circular de Viena que, por sinal, é o lugar em que o filme de Fernando Meirelles se encerra. A peça, portanto, não obedecia a tradição da dramaturgia clássica, em que o conflito central do espetáculo era individualizado na figura de um protagonista. Essa linha foi incorporada em sua essência pelo cinema ocidental, principalmente o americano. 
Curiosamente essa mesma estrutura foi recentemente adotada em “Até a eternidade” (Les Petits Mouchoirs – 2010) lançado em julho passado. Dirigido e escrito por Guillaume Canet, o roteiro, no entanto, segue outra regra do teatro clássico que é a da unidade espacial. Isto é, coloca uma dúzia de personagens numa casa de praia, aonde os conflitos também vão passando de um para outro, até que o acaso resolve tudo na cena final, em que todos se abraçam numa roda selada pelos diversos afetos que os aproximam. Em “360”, porém, além de o conflito central ser coletivizado, a regra clássica da unidade espacial também não é respeitada, ou seja, a história salta de Viena para Paris, Londres, Bratislava, Rio de Janeiro, Denver e Phoenix, para voltar a Viena. 
No entanto, a convenção da unidade temporal é obedecida, sem qualquer flashback, numa narrativa que se acelera a cada instante, privilegiando momentos de suspense, construídos por Meirelles de modo especialmente hábil. Principalmente a sequencia que envolvia a atriz Maria Flor e os atores Bem Foster e Antony Hopkins. Essas passagens assustadoras foram as mais comentadas dentre tudo o que se escreveu a respeito do filme, talvez porque tenham sido as que individualizam a emoção. Ou seja, o público tende a se interessar mais pelos personagens que correm perigo de vida ou se que encontram em situações extremas. De fato, a trama se esgarça e a dramaticidade do todo se dilui entre as partes. De resto, “360” é um belo trabalho de atores, montagem e direção que merece ser visto.
“360” 

Reino Unido/Áustria/França/Brasil, 2012, 115 min, 16 anos.
estreia 17 08 2012
gênero drama / suspense / romance
Distribuição Paris Filmes
Direção  Fernando Meirelles
Com Maria Flor, Juliano Cazarré, Ben Foster, Moritz Bleibtreu,
Rachel Weizs, Anthony Hopkins e Jude Law
COTAÇÃO
* * *
BOM

Em breve, nova temporada de avaliação do cinema brasileiro com o Festival de Brasília


Um festival totalmente renovado, com novas mostras competitivas, oficinas, debates e seminários. Em setembro, o Festival de Brasília do Cinema Brasileiro chega à sua 45ª edição. Ao longo de sua trajetória, o evento demonstrou ser o mais importante do país. Para começar, todos os doze longas-metragens, de ficção e documentário, das mostras competitivas do evento são inéditos. Embora o ineditismo tenha sido abolido como critério de seleção, em 2012 o público será brindado com títulos nunca antes exibidos em outros festivais. O resultado promete ser um festival ainda mais empolgante. Além disso, o evento homenageia seu fundador, o crítico e professor Paulo Emílio Salles Gomes, com um seminário sobre a crítica de cinema e um livro que analisa a sua importância histórica, organizado por Maria do Rosário Caetano
Haverá ainda o lançamento de um catálogo que conta um pouco da história do Festival e outro que reflete sobre a relação entre Brasília e o cinema.  O Festival de Brasília acontece de 17 a 24 de setembro, excepcionalmente nas salas do Teatro Nacional Cláudio Santoro. Tradicionalmente era abrigado pelo imenso Cine Brasília, que agora se encontra em reforma. Na abertura exibirá o longa-metragem “A Última Estação”, dirigido por brasiliense honorário Márcio Curi, uma narrativa poética e bem humorada da trajetória de um imigrante libanês no Brasil. As mostras competitivas serão exibidas na Sala Villa-Lobos do Teatro Nacional, que tem capacidade para acolher 1.307 espectadores. As projeções começam pelos curtas e longas de documentário e, às 21h, é a vez dos curtas de animação e ficção e os longas de ficção. Vai ser uma verdadeira maratona de filmes, concorrendo a prêmios no valor total de R$ 635 mil. 

sábado, 25 de agosto de 2012

Lançado em DVD o excelente docudrama "Conspiração Americana" de Robert Redford


Nestes tempos de em que o mensalão é julgado, é bom rever “A Conspiração americana”, que acaba de ser lançado em DVD. Dirigido por Robert Redford que em seu tempo foi o maior galã de Hollywood, o filme faz uma reflexão profunda sobre a própria natureza da democracia norte-americana por meio de um fato traumático ocorrido logo após a Guerra de Secessão, que foi o assassinato do presidente Lincoln. O crime foi resultado de uma conspiração de rebeldes sulistas que pretendiam desestabilizar o governo federal. Ansiosas por promover a punição exemplar dos culpados, as autoridades de segurança cometeram exageros, como incriminar a dona da pensão onde os conspiradores moravam. Naquele contexto, se defrontavam o ministro da guerra (Kevin Kline) que queria vê-la enforcada junto com os assassinos, e um senador liberal (Tom Wilkinson) que defendia o seu legítimo direito a um julgamento. Esse tipo de conflito é, aliás, recorrente na história daquele povo. Foi o que aconteceu, por exemplo, no tempo do macartismo e nos escândalos de Watergate e Guantánamo. Sem santificar nem demonizar qualquer desses dois lados, Redford nos apresenta esse debate político tal como se apresentava naquela fase em que as instituições do país estavam apenas se formando. Isso poderia redundar numa narrativa tediosa, não fosse a competência da direção e dos atores, com destaque para James McAvoy e Robin Wright, nos papéis do advogado e sua cliente. Para quem se interessa por política e história é indispensável. 

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Mais um mestre do cinema se despede de nós...

Padecendo de um câncer inoperável no cérebro, Tony Scott se suicidou ontem, atirando-se de uma ponte na cidade de São Pedro, perto de Los Angeles. Tinha 68 anos e, em sua bagagem, levou filmes como "Fome de Viver", "Prometheus", "Sede de Vingança", "Déjá Vù" e outros 20 títulos como diretor.

domingo, 19 de agosto de 2012

Excelentes intérpretes fazem a grandeza do pequeno e modesto "Um divã para dois"


O que caracteriza a comédia “Um Divã para Dois” é a ausência de pretensões e de afetação. Trata-se de um filme pequeno, no sentido de ser uma produção modesta, apenas com um fio de história que, além de tudo, se mostra banal e corriqueira. Vejamos: com mais de 60 anos de idade, um casal americano de classe média percebe que a base afetiva de seu casamento já caducara. Ao se dar conta disso, a esposa obriga o marido a largar a firma de contabilidade durante uma semana para que ambos experimentem uma vivência com um terapeuta de casais em outra cidade. Ponto. É só isso, ou seja, o roteiro coincide passo a passo com as etapas desse tratamento. Pode ser que a roteirista Vanessa Taylor  ̶ acostumada a redigir séries para a TV, tenha enfrentado dificuldades em convencer o diretor David Frankell, (de “O Diabo veste Prada”) a aceitar o projeto, ou vice versa. 
No entanto, os protagonistas Meryl Streep e Tommy Lee Jones se mostram dispostos a provar aqui que fazer o papel de gente comum pode ser mais complicado e difícil do que interpretar personagens de grande porte, como rainhas ou agentes secretos. Imaginem a dificuldade de exprimir e dar vida a figuras que passam a maior parte do filme travadas, praticamente mudas diante de um psicólogo (Steve Carell). Este lhes bombardeia com perguntas das mais embaraçosas, como qual foi a última ocasião em que transaram, ou o por que se considera um homem casado. Ao que o marido responde “porque tenho uma certidão e pago as despesas da casa”. É incrível, mas essa dupla de atores não só da conta do recado como nos obriga a recomendar o filme pela excelência de seu trabalho.
UM DIVÃ PARA DOIS 

Hope Springs
EUA, 2012, 100 min, 12 anos.
estreia 17 08 2012
gênero comédia 
Distribuição Imagem Filmes
Direção David Frankel 
Com Steve Carell, Meryl Streep, Tommy Lee Jones
COTAÇÃO
* * *
BOM

"Corações sujos" é um filme brasileiro que fez mais sucesso no Japão do que entre nós

Como os outros livros de Fernando Morais, além da trama básica e essencial da narrativa “Corações sujos” traz uma imensa carga de informações históricas que aprofundam ao máximo o relato do que acontece. Elaborar um espetáculo de cinema de com 90 minutos a partir dessa complexa galáxia factual era o desafio do diretor Vicente Amorim. Foi preciso então eleger alguns personagens e um drama central para trabalhar o roteiro. Um fotógrafo e a professora primária sua esposa são arrastados por um conflito inesperado. No final da 2ª Guerra muitos dos imigrantes japoneses no Brasil não acreditaram que seu país tivesse sido derrotado. A barreira da língua os mantinha afastados dos meios de comunicação e dos demais cidadãos, permitindo que desenvolvessem uma atitude hostil em relação aos patrícios que se adequavam à realidade. 
Muitas vidas foram destruídas e alguns integrantes do movimento se aproveitaram da situação. A maneira como o diretor nos insere nesse torvelinho é exemplar e algumas passagens, como as execuções dos supostos traidores são recriadas com intensa dramaticidade, contrastando com a delicadeza dos gestos mais comuns da vida cotidiana dos imigrantes. Boa parte dos intérpretes são profissionais consagrados no Japão, como Tsuyoshi Ihara que faz o papel do fotógrafo, um dos protagonistas em “Cartas de Iwo Jima”, de Clint Eastwood. Mais preocupado com a construção de imagens do que com a explicação dos acontecimentos, Amorim evita localizá-los nesta ou naquela cidade, mas chega a reconstituir uma colônia nipônica de São Paulo e uma locomotiva da época numa estação do interior do estado. O filme fez muito sucesso no Japão, mesmo com cenas em que o sangue dos assassinados remete à própria bandeira do país.

CORAÇÕES SUJOS 

Brasil, 2012, 107 min, 14 anos.
estreia 17 08 2012
gênero docudrama / história 
Distribuição Downtown Filmes;
Direção Vicente Amorim 
Com Du Moscovis, Tsuyoshi Ihara, Takako Tokiwa
COTAÇÃO
* * *
B O M

sábado, 11 de agosto de 2012

Em setembro na Belas Artes: curso sobre tendências do Cinema Contemporâneo

Para começar em setembro, a Escola de Belas Artes agendou um curso sobre Cinema Contemporâneo que deverei ministrar. O principal foco são as tendências da produção atual. Segue o link para mais explicações:
http://www.belasartes.br/cursoslivres/?pagina=curso&curso=cinema-contemporaneo-analise-critica
Fotos: "Para Roma com amor" e "A Invenção de Hugo Cabret"

O franco-belga “O exercício do poder” é o melhor filme político desta temporada


“O exercício do poder” tem como protagonista um ministro dos transportes do governo francês atual que, logo no início do filme, visita a cena de um acidente de ônibus no qual várias crianças tinham morrido. Como a televisão deverá entrevistá-lo, a assessora de imprensa tem o cuidado de pedir ao prefeito local que lhe empreste a gravata, porque ela combina melhor com o terno que estava usando. Essa referência à troca da gravata faz lembrar “A tomada do poder por Luiz XIV” (1966) de Roberto Rossellini, no qual o rei usava as vestimentas e moda como um instrumento de autoridade. Pode parecer o cúmulo da hipocrisia, mas vemos que, de fato, o governante fica comovido com o desastre e faz um pequeno discurso emocionado diante das câmaras. Ao terminar, ele comenta com a assessora que não gostou de determinada frase do pronunciamento. Aí, ficamos na dúvida: tudo aquilo não passava de uma encenação eleitoreira, ou ele se importava de verdade com as pessoas? Em seguida, porém, percebe-se que as duas opções estão igualmente corretas e, parecido com o poeta de Fernando Pessoa, o político “chega a fingir que é dor a dor que deveras sente”. 
A passagem aponta para um procedimento que o diretor e roteirista Pierre Schoeller retoma diversas vezes, porque sua meta é expor as ambiguidades do Estado e de quem trabalha dentro dele e para ele. Não aborda direta ou intensamente nenhuma dessas mazelas mais conhecidas do público sul americano, como a corrupção, o abuso do poder ou a manipulação das informações. Premiado pelo Cesar que é o equivalente frances do Oscar, o roteiro original se concentra na esquizofrenia dos conflitos internos no seio dos gabinetes e dos partidos. E no frenesi que leva à mudança constante de políticas e de cargos, para acompanhar as oscilações da opinião pública – contrastando com a tendência à inércia de uma máquina estatal alicerçada no tempo da monarquia absolutista. 
Essa contradição se manifesta no íntimo do protagonista, interpretado com maestria pelo belga Oliver Gourmet, que fora premiado em Cannes por seu trabalho em “O Filho” (2002), dos irmãos Dardenne – que, aliás, produziram “O exercício do poder”. Ele se imagina como um tigre, sempre disposto a trucidar os inimigos sem hesitação, mas num sonho, se identifica com um predador diferente: o crocodilo, cujo único esforço é escancarar a boca para devorar a presa entregue voluntariamente ao seu apetite. Ora felino, ora reptil, quando se descuida, o personagem deixa que a humanidade se manifeste dentro de si e chora ao morrer um humilde colaborador, vomita ao se lembrar dos mortos no acidente, se embebeda junto com um motorista que mora num trailer e abraça o seu chefe de gabinete como se fosse um amigo de infância. 
É na relação entre essas duas figuras que reside um dos aspectos mais interessantes da trama, enquanto retrato cinematográfico da dinâmica estatal naquele país. Interpretado pelo veterano Michel Blanc que ganhou o Cesar por esta atuação, esse burocrata encarna a mecanicidade da estrutura política. Funcionário público de carreira, ele se comporta como um “criado mudo”, tão frio e indiferente quanto um robô programado para obedecer a qualquer comando sem discussão. Por outro lado, se nutre da letargia do sistema e fica secretamente feliz quando uma novidade qualquer é barrada pelos inúmeros obstáculos que as mudanças precisam enfrentar naquele universo político. Essa dicotomia que separa os agentes governamentais entre servidores públicos concursados e os ocupantes de cargos eletivos ou “de confiança” também acontece entre nós. 
Mas, o filme é instrutivo ao mostrar certas diferenças entre os diversos esquemas de governo como, por exemplo, o fato das autoridades francesas serem cercadas por mais pompa e cerimônia que as nossas – desfrutando, porém, de mordomias mais modestas. É admirável essa dramaturgia que Pierre Schoeller constrói ao revelar e contrapor as engrenagens de dois mecanismos de diferentes naturezas, funcionando ao mesmo tempo e no mesmo lugar, um influenciando o outro: a racionalidade da dinâmica e a lógica da permanência. Em função da crise econômica, uma facção do governo quer privatizar as estações de trem, contra a vontade do nosso personagem central, o ministro dos transportes. Para ele a medida é impopular e contraria as promessas da campanha eleitoral, mas começa a ser pressionado a mudar de ideia, o que o obriga a optar entre o movimento do tigre e a postura do crocodilo.
O EXERCÍCIO DO PODER
L’exercice de L’etat 

França - Bélgica / 112 min., 16 anos
estreia 10 08 2012
gênero drama / política
Direção  Pierre Schoeller 
Com Michel Blanc e Oliver Gourmet
COTAÇÃO
* * * * *
EXCELENTE

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Caixa de risadas: comédias italianas clássicas de Germi e Monicelli lançadas em DVD


Todos sabem que rir é o melhor remédio, para todos os tipos de males e contrariedades. O problema é descobrir onde se adquire essa panaceia para a qual não existem contraindicações e nem apresenta efeitos colaterais negativos. No que se refere ao cinema, o engano maior é acreditar em títulos que se colocam falsamente como comédias, mas que ao falhar na provocação do riso, deixam na boca o gosto amargo do dinheiro jogado fora. Como garantir, então a certeza de um fígado desopilado, como se dizia antigamente? Nossa sugestão é recorrer à comedia italiana clássica, conteúdo de uma caixa que chega às locadoras com três filmes comicamente infalíveis. “Divórcio à Italiana” (foto acima), de Pietro Germi, com Marcello Mastroiani, Stefânia Sandrelli e Lando Buzzanca, filme ganhador de Oscar de melhor roteiro em 1961.
Um aristocrata completamente imbecil tem a ideia de se livrar da esposa, induzindo-a a praticar o adultério. Em “Os eternos desconhecidos” (foto acima), Mario Monicelli faz a caricatura dos filmes de assalto, na qual um bando de idiotas imagina um golpe infalível. No elenco, Claudia Cardinale, Vitorio Gassman, Marcello Mastroiani e o célebre Totó. Já em “Seduzida & Abandonada” (foto abaixo), de Pietro Germi, com Saro Urzi e Stefania Sandrelli, uma adolescente é seduzida pelo noivo da própria irmã. Mas a moça engravida e o pai dela obriga o rapaz a se casar. Só que ela foge é a família precisa “salvar a sua honra” custe o que custar. Saro Urzi foi premiado melhor ator no Festival de Cannes de 64 por esse trabalho. 

"A Beira da Caminho": gente simples, sentimentos complexos e gestos generosos.


Em 2005 com “Os dois Filhos de Francisco” o diretor Breno Silveira provou ser possível fazer no Brasil um cinema ao mesmo tempo popular e de qualidade, ou seja, isento de apelação ou grosserias caricaturais, buscando a sobriedade expressiva e a elegância formal e, mesmo assim, alcançar o grande público. Esse caminho estava aberto desde 1980 por Nelson Pereira dos Santos com “A Estrada da Vida”, em que focalizava a saga da dupla sertaneja Milionário e José Rico. Agora Silveira lança “A beira do Caminho”, um melodrama minimalista inspirado em canções de Roberto Carlos, focalizando gente simples, mas capaz de grandeza nos gestos e de sentimentos delicados. Dira Paes e o menino Vinícius Nascimento (que brilharam em “Ó paí ó” – 2007) bem como a fotografia de Lula Carvalho funcionam como sustentação perfeita para o drama. O ator baiano João Miguel faz um caminhoneiro amargurado por uma mágoa que de início não sabemos qual seja e que se manifesta quando um garoto de nove anos entra clandestinamente em seu caminhão. 
Conforme a gramática do gênero, a rejeição a princípio inevitável vai se transformando em amizade, ao mesmo tempo em que recebemos mais informações quanto à desgraça que aflige o protagonista. Elas chegam em doses diminutas, numa louvável economia de diálogos e flashbacks. Junto com a música que escorre pela narrativa, assim como os rios ao lado dos quais o motorista costuma acampar ao longo da viagem, o filme propõe uma simbologia de superação da dor por meio da explicitação dos afetos. Mas sempre com um mínimo de explicações verbais e raríssima exacerbação emocional. Trata-se aqui da questão da paternidade – condição que, às vezes, as pessoas não podem assumir – mas também um papel que é possível desempenhar, mesmo sem querer. 
Tanto é assim que, sabiamente, o filme foi lançado às vésperas do dia dos pais. Na tradição do cinema brasileiro anterior aos anos 1950, os filmes de maior sucesso eram aqueles que associavam drama e música popular. Tanto que, até hoje, “O ébrio” baseado numa canção “dor de cotovelo” de Vicente Celestino é citado como o campeão de bilheteria de todos os tempos. Este trabalho de Breno Silveira a partir do imaginário de Roberto e Erasmo Carlos é um sinal aceso para os cineastas que ainda não descobriram esse manancial de histórias e personagens que povoam a MPB. 
Na derradeira sequencia do filme, há uma cena em que a câmara está posicionada na cabine do caminhão, mostrando o caminhoneiro e seu carona a conversar na calçada. É como se fosse a imagem de uma câmara subjetiva, destinada a entronizar o veículo como um terceiro personagem que, afinal, acompanhara em silêncio a viagem desde o seu início e o tempo todo. Este é um caso exemplar de merchandising sutil e eficiente, porque a produção é parcialmente financiada pela Volvo.

A BEIRA DO CAMINHO 
Brasil, 2011, 102 min, 14 anos.
estreia 10 08 2012
gênero drama / social / melodrama
Distribuição: Fox Filmes 
Direção Breno Silveira 
Com João Miguel, Vinicius Nascimento, Dira Paes 
COTAÇÃO

* * * *
ÓTIMO

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Trilogia da Incomunicabilidade de Antonioni: três obras-primas reunidas numa única caixa


Lançada em DVD pela Versátil a célebre Trilogia da Incomunicabilidade de Michelangelo Antonioni (1912-2007), numa caixa com três discos, repleta de informações adicionais, como reportagens, entrevistas e depoimentos do autor e de outros cineastas sobre estas obras-primas dos anos de 1960: “A Aventura”, “A Noite” e “O Eclipse”(foto abaixo: Alain Delon e MonicaVitti). A surpresa começou no início da década com o diretor recorrendo a planos sequencia em tomadas bem abertas, nos quais a perplexidade e o tédio dos personagens incluía o ambiente em que eles se deslocavam. “A Aventura” (foto acima: Monica Vitti e Gabriele Ferzetti), o primeiro da série se situa numa ilha vulcânica do Mediterrâneo em que uma mulher rica desaparece e, enquanto a procuram, um relacionamento se inicia entre seu namorado e a melhor amiga. 
Numa entrevista de 1970, Antonioni dizia: “Talvez em todos os meus filmes eu esteja procurando as pegadas dos sentimentos humanos, num mundo em que elas foram enterradas para dar lugar à aparência: um mundo em que os sentimentos obedecem às relações públicas”. Ao longo da trilogia, ele foi simplificando o seu processo de trabalho. Após terminar “A Noite” (foto abaixo: Marcelo Mastroiani e Jeanne Moureau), declarou que passara a dar mais importância à verdade contida em cada cena do que até mesmo à narrativa: “Abandonei parte da bagagem técnica, eliminando as transições lógicas entre as sequencias” – dizia – “Cinema não é imagem, paisagem, postura, gesto. Mas um todo indissolúvel, com uma duração que lhe é própria e que determina a sua essência”. De fato, mais do que histórias com começo, meio e fim, as obras de Antonioni podem ser vistas como poemas cinematográficos.

Em “Bel Ami – o sedutor”, Robert Pattinson derruba uma história de Maupassant


O fato de “Bel Ami – o sedutor” se basear no romance mais conhecido do célebre escritor Guy de Maupassant (1850–1893) não deve ser visto como garantia de qualidade. Esta coprodução ítalo-franco-britânica não passa de uma desajeitada operação de marketing para faturar com a popularidade do inglês Robert Pattinson obtida como sanguessuga na série “Crepúsculo” – ator que mostra uma única expressão de garoto malvado ao longo da história. A própria escolha desse texto que deu origem a vários filmes e seriados de TV deve ter obedecido a uma motivação oportunista, porque o personagem é uma espécie de vampiro social que sugava a vitalidade e o prestígio de mulheres da sociedade francesa no tempo da Terceira República, ou seja, na chamada belle époque
O roteiro não atribui clareza e nem credibilidade à trajetória desse sujeito sem carisma ou simpatia, que é colocado como irresistível para mulheres influentes na época e interpretadas por atrizes do calibre de Uma Thurman, Kristin Scott Thomas e Christina Ricci. No caso específico de Uma Thurman, fica evidente o constrangimento em contracenar com um ator dotado de tão parcos recursos interpretativos. Uma decodificação das sutilezas próprias do universo social francês do final do século 19 seria necessária à transposição do livro para o filme. Mas esse cuidado foi trocado pelo exibicionismo dos discutíveis atrativos masculinos do protagonista, cuja única estratégia era derrubar uma dama após outra no tabuleiro do jogo político da elite da época.
BEL AMI – O SEDUTOR
Bel ami
estreia 03 08 2012
gênero romance de época / drama
EUA/França/Itália, 2012, 103 min, 14 anos.
Distribuição Califórnia Filmes
Direção de Declan Donnellan e Nick Ormerod
Com Robert Pattinson, Uma Thurman, 
Kristin Scott Thomas, Cristina Ricci
COTAÇÃO
* *
REGULAR