1. Uma estrutura narrativa pouco usual: combina o suspense natural à competição em que o protagonista se acha envolvido (será que o favelado consegue se tornar um milionário?) com o mistério sobre o seu passado que vai se desvendando aos poucos (de onde ele veio?). Do mesmo modo, articula o realismo brutal de algumas lembranças (a miséria e o conflito étnico na favela) com a transfiguração poética dessa realidade (encontro com a menina que ama) para “explicar” como ele pode ter dado as respostas certas para cada pergunta (como, por exemplo, o nome dos Três Mosqueteiros);
2. A escolha de intérpretes desconhecidos: pelo menos no Ocidente, porque alguns deles são veteranos profissionais que já filmaram nos EUA, como Irrfan Khan que fez o papel de inspetor de polícia e, recentemente, vimos em Viagem para Darjeeling, Nome de Família e O Preço da Coragem. Outros são celebridades na Índia, como a super-modelo Frieda Pinto (foto acima) e Anil Kapoor (na foto superior e abaixo). Este, no papel de apresentador de TV, pertence a uma verdadeira dinastia de atores de sucesso e, aos 50 anos, já trabalhou em mais de 100 produções. Esse contraste tem o efeito de ampliar a impressão de realidade a ser transmitida pelos atores infantis − um recurso que, aliás, foi inaugurado por Hector Babenco, ao filmar Pixote (1981). Naquele filme, jovens intérpretes amadores, como Fernando Ramos da Silva, contracenavam com Marília Pêra, Beatriz Segall, Rubens de Falco e Jardel Filho.
3. A opção por um misticismo assumido, em que a religião ocupa um papel central na trama. Assim como em seu filme anterior Caiu do Céu, em que alguns santos católicos, como Santa Clara e São José conversam com o protagonista, neste filme, o personagem central tem uma clara visão de Vishnu (uma das três manifestações da suprema divindade, ao lado de Bhrama e Shiva). O que é curioso, porque ele é muçulmano e justamente por isso, sua mãe morrera queimada num conflito com hinduístas. Mais curioso ainda é ver a academia de Hollywood e, por extensão todo o povo americano, aplaudindo de pé um filme em que o herói é devoto de Maomé. Ponto para Danny Boyle!
3. A opção por um misticismo assumido, em que a religião ocupa um papel central na trama. Assim como em seu filme anterior Caiu do Céu, em que alguns santos católicos, como Santa Clara e São José conversam com o protagonista, neste filme, o personagem central tem uma clara visão de Vishnu (uma das três manifestações da suprema divindade, ao lado de Bhrama e Shiva). O que é curioso, porque ele é muçulmano e justamente por isso, sua mãe morrera queimada num conflito com hinduístas. Mais curioso ainda é ver a academia de Hollywood e, por extensão todo o povo americano, aplaudindo de pé um filme em que o herói é devoto de Maomé. Ponto para Danny Boyle!
4. Nos anos 30, para combater o desânimo da crise, os filmes populistas de Frank Capra pregavam a excelência do sistema, em que os profissionais esforçados e competentes seriam recompensados. Aqui, Danny Boyle mostra um homem que é premiado diretamente pela providência divina − por sua índole pacífica e sua capacidade de amar. Fala, portanto, de valores mais universais, que se referem à humanidade como um todo, e não apenas aos agraciados que vivem na sede do capitalismo.
5. Toma um livro de autor indiano e vai filmá-lo lá, na periferia do sistema, interagindo criativamente com os criadores locais, especialmente os músicos, que ajudaram a revestir o espetáculo de franqueza e autenticidade. Assim, o projeto lança pontes entre continentes, linguagens, simbologias, culturas e economias.
Um comentário:
Acredito que um certo cinismo tem pairado no ar. Críticos brasileiros (diferente dos americanos) aparentemente não gostaram do filme. Acho que, num filme como esse, as pessoas e críticos em geral não podem ir assistir imaginando que vão encontrar uma obra real e verdadeira. Na sua mistura, Slumdog Millionarie mescla a fantasia e a realidade, e resulta num filme lúdico, onde se deve entende-lo assim. Ao buscar coerência na obra, é óbvio que gerará certo desgosto. Uma pena. Não é um grande filmes, mas, ao menos, tem um texto muito original, além de um otimismo que há muito não se via. Um filme mais para ser sentido do que interpretado.
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