Nesta continuação de “Wall Street – Poder e Cobiça” (1987), além de mostrar o protagonista Gordon Gekko (Michael Douglas) 20 anos depois, Oliver Stone atualiza o ambiente em que ele se movimentava. Assim, vemos como o corretor de ações amadureceu após ter passado sete anos na cadeia e como se comportava a Bolsa de Valores de Nova York, no exato momento em que enfrentava a crise de 2008 – por muitos analistas, considerada até mais profunda do que foi a de 1929. Por isso, o maior problema de Allan Loeb − o principal roteirista de “Wall Street – o Dinheiro nunca Dorme” - é trabalhar numa linha estocástica, acrescentando uma multiplicidade de dados acumulados pela realidade na trama desenvolvida no roteiro original de Stanley Weiser. Essa tarefa é representada logo de início, na sequência da saída da prisão, em que se devolvem os objetos pessoais que o detento portava no primeiro dia da sua pena, entre estes um relógio Rolex e um telefone celular de dois quilos e meio. Ou seja, trata-se de estabelecer uma continuidade clara com a figura central do filme anterior, respeitando o seu caráter essencial, mas integrando-o no mundo de hoje.
A solução foi transformá-lo inicialmente num pensador crítico do sistema financeiro, que não apenas questionava seus próprios princípios (“a ganância é boa”), mas prevê a crise que se avizinhava. Libertado um pouco antes dos primeiros sinais do desastre financeiro dos Estados Unidos, ele ainda tem tempo de condenar a onda de especulação imobiliária num livro intitulado “Greed is Good?”. Só que de 1987 para cá, o próprio Oliver Stone também se modificou, desenvolvendo talentos e preferências antes insuspeitados e que se manifestam com clareza em “Ao sul da Fronteira” (2009) um documentário abertamente panfletário, dedicado a elogiar a chamada “revolução bolivariana”. Provavelmente em função dessas mudanças estéticas, ele introduz recursos visuais um tanto primários na montagem: por exemplo, uma bisonha ilustração gráfica para explicar a argumentação de um personagem sobre uma nova fonte de energia alternativa. Ou uma óbvia fileira de peças de dominó desabando, para se referir à quebradeira em série dos bancos de investimento. É como se Stone estivesse aqui invejando Michael Moore, ou mesmo Al Gore.
Por outro lado, num discurso de poucos minutos, Gekko diagnostica a patologia estrutural do capitalismo e profetiza a gestação da crise numa palestra para divulgar o livro. Parece até que o vilão se redimiu. Pelo menos é o que imagina o noivo (Shia LaBeouf) da sua filha − um jovem e ambicioso corretor da bolsa que pretende descobrir de onde vieram os boatos responsáveis pela bancarrota da empresa em que trabalhava. Além da perda do emprego, ele quer vingar a morte do ex-patrão e mentor (Frank Langella) que se suicidou no dia seguinte à falência. Em troca da ajuda de Gekko, o rapaz promete facilitar-lhe a aproximação com a filha (Carey Mulligan) que tinha cortado relações com o pai criminoso. Graças a esse lado de melodrama, em que não faltam surpresas e reviravoltas narrativas, o filme funciona como entretenimento para o grande público. Seus personagens, no entanto, parecem ter sido construídos para nos oferecer um leque dos tipos humanos envolvidos com a crise e, nesse sentido, tendem para a alegoria. Todos se deitam e acordam pensando em dinheiro.
Não é por idealismo que o noivo defende a energia alternativa, mas porque se acha convencido de que esse é o grande negócio do futuro. A mãe dele (Susan Sarandon) é uma enfermeira competente que abandonara a profissão para vender imóveis hiper-valorizados. O falecido mentor não deve ter se matado apenas por que perdera a fortuna e a empresa, mas porque no processo, provavelmente, seriam reveladas grandes falcatruas do seu passado. Até filha de Gekko mantém um site de jornalismo investigativo "sem fins lucrativos" apenas porque, numa época de grandes escândalos, a quantidade de acessos (e o faturamento) cresce dia a dia. Em resultado desse esquema dramático habilmente arquitetado, há inclusive uma passagem especialmente emotiva e convincente, em que Gekko pede perdão à moça e mostra-se verdadeiramente arrependido. Antes do encerramento, porém, veremos que aquilo tudo talvez não passe de pistas falsas, como aquelas que Hitchcok costumava espalhar em seus filmes para iludir o espectador. Isto é, uma série de artifícios à qual Oliver Stone recorre para enunciar a sua visão particular acerca das crises cíclicas do capitalismo e que ele e seus personagens chamam de “bolhas”. Trata-se de um ponto de vista pré-marxista, remetendo a um indisfarçado darwinismo que o leva a considerá-las “evolucionárias” e, portanto, inerentes à própria natureza.
A solução foi transformá-lo inicialmente num pensador crítico do sistema financeiro, que não apenas questionava seus próprios princípios (“a ganância é boa”), mas prevê a crise que se avizinhava. Libertado um pouco antes dos primeiros sinais do desastre financeiro dos Estados Unidos, ele ainda tem tempo de condenar a onda de especulação imobiliária num livro intitulado “Greed is Good?”. Só que de 1987 para cá, o próprio Oliver Stone também se modificou, desenvolvendo talentos e preferências antes insuspeitados e que se manifestam com clareza em “Ao sul da Fronteira” (2009) um documentário abertamente panfletário, dedicado a elogiar a chamada “revolução bolivariana”. Provavelmente em função dessas mudanças estéticas, ele introduz recursos visuais um tanto primários na montagem: por exemplo, uma bisonha ilustração gráfica para explicar a argumentação de um personagem sobre uma nova fonte de energia alternativa. Ou uma óbvia fileira de peças de dominó desabando, para se referir à quebradeira em série dos bancos de investimento. É como se Stone estivesse aqui invejando Michael Moore, ou mesmo Al Gore.
Por outro lado, num discurso de poucos minutos, Gekko diagnostica a patologia estrutural do capitalismo e profetiza a gestação da crise numa palestra para divulgar o livro. Parece até que o vilão se redimiu. Pelo menos é o que imagina o noivo (Shia LaBeouf) da sua filha − um jovem e ambicioso corretor da bolsa que pretende descobrir de onde vieram os boatos responsáveis pela bancarrota da empresa em que trabalhava. Além da perda do emprego, ele quer vingar a morte do ex-patrão e mentor (Frank Langella) que se suicidou no dia seguinte à falência. Em troca da ajuda de Gekko, o rapaz promete facilitar-lhe a aproximação com a filha (Carey Mulligan) que tinha cortado relações com o pai criminoso. Graças a esse lado de melodrama, em que não faltam surpresas e reviravoltas narrativas, o filme funciona como entretenimento para o grande público. Seus personagens, no entanto, parecem ter sido construídos para nos oferecer um leque dos tipos humanos envolvidos com a crise e, nesse sentido, tendem para a alegoria. Todos se deitam e acordam pensando em dinheiro.
Não é por idealismo que o noivo defende a energia alternativa, mas porque se acha convencido de que esse é o grande negócio do futuro. A mãe dele (Susan Sarandon) é uma enfermeira competente que abandonara a profissão para vender imóveis hiper-valorizados. O falecido mentor não deve ter se matado apenas por que perdera a fortuna e a empresa, mas porque no processo, provavelmente, seriam reveladas grandes falcatruas do seu passado. Até filha de Gekko mantém um site de jornalismo investigativo "sem fins lucrativos" apenas porque, numa época de grandes escândalos, a quantidade de acessos (e o faturamento) cresce dia a dia. Em resultado desse esquema dramático habilmente arquitetado, há inclusive uma passagem especialmente emotiva e convincente, em que Gekko pede perdão à moça e mostra-se verdadeiramente arrependido. Antes do encerramento, porém, veremos que aquilo tudo talvez não passe de pistas falsas, como aquelas que Hitchcok costumava espalhar em seus filmes para iludir o espectador. Isto é, uma série de artifícios à qual Oliver Stone recorre para enunciar a sua visão particular acerca das crises cíclicas do capitalismo e que ele e seus personagens chamam de “bolhas”. Trata-se de um ponto de vista pré-marxista, remetendo a um indisfarçado darwinismo que o leva a considerá-las “evolucionárias” e, portanto, inerentes à própria natureza.
WALL STREET – O DINHEIRO NUNCA DORME
Wall Street - Money Never Sleeps
estreia 27 09 2010
EUA - 2010 – 138 min. - 14 anos
Gênero Drama
Distribuição Fox Films
Direção Oliver Stone
Wall Street - Money Never Sleeps
estreia 27 09 2010
EUA - 2010 – 138 min. - 14 anos
Gênero Drama
Distribuição Fox Films
Direção Oliver Stone
Com Michael Douglas, Susan Sarandon,
Shia LaBeouf e Frank Langella
COTAÇÃO
* * *
B O M
Shia LaBeouf e Frank Langella
COTAÇÃO
* * *
B O M
Nosso amigo Carlos de Souza Dantas Gandolfo trabalha no mercado financeiro e declara que gostou do filme, especialmente da fotografia e do modo como retratou a crise de 2008. Mas assinala que "alguns jargões e siglas não estão bem traduzidas e talvez alguém mais afeito a esses termos poderia traduzir melhor". De fato, eu me perdi um pouco nas conversas em que os personagens tratavam de questões técnicas de economia e finanças. Algumas passagens, aliás, nem apareciam nas legendas, como certas referências a ursos e touros. Felizmente o Carlos me explicou que o touro (bull) simboliza o mercado em tendência de alta, enquanto o urso (bear) representa o mercado em baixa. Ele salienta que há uma estátua de touro em Wall Street, mas não existe nenhuma estátua de urso, por motivos óbvios.
Um comentário:
Sr. Luciano,
Gostaria de saber se seria possível a sua ajuda em um trabalho acadêmico sobre o filme de Hitchcock e a linguagem usada nele. Sou estudante de Letras da UFMG, do primeiro período e, se possível gostaria de fazer algumas perguntas ao senhor sobre "Um corpo que cai" e sua linguagem simbólica. Seria um grande enriquecimento.
Portanto, se possível, me responda no email isa_bellabsouza@hotmail.com
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