Agora Padilha volta ao documentário, mas abandona o formato “clássico” em que convivem vários recursos heurísticos e expressivos, como a entrevista, os dados estatísticos, a pesquisa de referências (de sons, imagens e idéias), o debate e até a encenação. Em Garapa, ele assume um estilo de documentário, no qual o cineasta se exime absolutamente de manipular e interferir no que é filmado. Na metodologia original do cinema “direto”, inaugurada no final da década de 1950 e no início dos anos 60, a câmara se posiciona como “uma mosca na parede”, apenas observando e registrando, sem jamais interagir com o objeto, para que o epectador possa chegar às suas próprias conclusões. A experiência seminal dessa vertente foi Les Racquetteurs, realizada no Canadá, em 1958: um filme de 17 minutos sobre uma convenção festiva típíca do Québec, que impressiona pela ruidosa euforia de seus participantes (foto abaixo). Eles, aliás, não precisam representar nada para a câmara, porque já estão “encenando” alegria e contentamento uns para os outros.
Garapa não tem nada a ver com festa ou alegria, mas Padilha endossa os princípios éticos e estéticos acima citados, convidando-nos a vivenciar a fome junto com quem a sofre. Ele declara:
“Essa é uma experiência que só pode ser compreendida quando você se cola em pessoas que, efetivamente, passam fome. Só assim é possível ter o entendimento ideal, que vai além do que se lê em estatísticas. Um entendimento emocional, sem nenhum filtro intelectual.”
Mas ele mesmo aplica um “filtro” de elegante branco e preto sobre todas as imagens do filme. Para quê? Para torná-las mais suportáveis − como a própria dor da fome, “enganada” pela água morna açucarada? Não seria isso uma forma gráfica de manipulação e interferência? Se couber ao público elaborar as suas próprias conclusões, como se configura um “entendimento emocional” a respeito do problema? Que efeito poderia resultar dessa overdose de imagens dolorosas, com seres humanos definhando em vida por falta de alimento? Indignação ou amortecimento?
Garapa não tem nada a ver com festa ou alegria, mas Padilha endossa os princípios éticos e estéticos acima citados, convidando-nos a vivenciar a fome junto com quem a sofre. Ele declara:
“Essa é uma experiência que só pode ser compreendida quando você se cola em pessoas que, efetivamente, passam fome. Só assim é possível ter o entendimento ideal, que vai além do que se lê em estatísticas. Um entendimento emocional, sem nenhum filtro intelectual.”
Mas ele mesmo aplica um “filtro” de elegante branco e preto sobre todas as imagens do filme. Para quê? Para torná-las mais suportáveis − como a própria dor da fome, “enganada” pela água morna açucarada? Não seria isso uma forma gráfica de manipulação e interferência? Se couber ao público elaborar as suas próprias conclusões, como se configura um “entendimento emocional” a respeito do problema? Que efeito poderia resultar dessa overdose de imagens dolorosas, com seres humanos definhando em vida por falta de alimento? Indignação ou amortecimento?
Entre Les Racquetteurs e a de Garapa existem, é claro, diferenças de forma e conteúdo. O primeiro é uma celebração e o segundo um lamento. Um se limita a registrar um evento, ao interromper festivamente o cotidiano de uma cidade canadense, enquanto outro dá voz aos personagens centrais dessa tragédia instalada no dia-a-dia de três famílias. O que estes dizem ou deixam de dizer no filme depende, evidentemente, da edição e esta insinua coisas além do que designam as palavras, como a diferença de comportamento entre os homens e as mulheres. E como um inquietante sorriso estampado quase o tempo todo no rosto de uma moradora da periferia de Fortaleza. (foto acima). Mesmo quando se queixa do marido e quando a assistente social lhe pergunta porque ela não se separa e continua tendo filhos com ele. Será que, como dizia Glauber Rocha, o filme está denunciando os oprimidos para os opressores?
Garapa
Direção José Padilha
Brasil - 2008
Estréia 19/05/2009
Gênero; documentário
Brasil - 2008
Estréia 19/05/2009
Gênero; documentário
Distribuição: Downtown
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