O Festival de Cinema de Brasília começou muito bem,
com uma noite em que se manifestaram pelos menos 4 obras primorosas. O documentário
curto “Câmara Escura”, do pernambucano Marcelo Pedroso; o curta de animação “Linear”
do paulista Amir Admoni; os dois longas: “Um filme para Dirceu” da paranaense
Ana Johann e o de ficção “Eles Voltam”, do pernambucano Marcelo Lordello. Todos
revelam a elevação do nível artesanal, estilístico e cultural dos jovens
realizadores brasileiros. “Câmara Escura” consiste numa ousada experimentação
na qual o diretor solta a sua câmara no mundo, mais ou menos como alguém que
abre a porta da gaiola para que o passarinho possa sair voando. Na verdade,
procura colocar em prática uma das ambições essenciais do gênero, que é a
criação de uma imagem do real produzida pela câmara de modo indicial, ou seja, sem
interferência significativa de seu operador. No caso, a máquina seria
manipulada pelas próprias pessoas escolhidas para aparecer diante dela. Já o curta paulista de animação é tecnicamente impressionante e o impacto que
causa é inversamente proporcional à sua duração de apenas 6 minutos (acima). Imagine um
ponto produzindo uma linha corporificada numa faixa de trânsito riscada sobre
uma rua de São Paulo.
A sequencia do festival promete trazer boas surpresas, como “Um filme para Dirceu”,
documentário da paranaense Ana Johann. A linha do filme é a do documentário
participativo, em que a realizadora se coloca como uma das personagens deste
filme que tem como diretriz filmar o cotidiano de Dirceu
Cieslinski, um jovem sanfoneiro dedicado à música sertaneja de raiz e que
também se mostra um humorista nato (fotos abaixo e acima). O filme é
recheado de passagens cômicas, principalmente nas cenas em que aparecem os
amigos do personagem. A cineasta empregou três anos nesse projeto, acompanhando
o rapaz que, de certa forma, ia colaborando com a captação dos recursos e
direcionado as entrevista com muito humor. Um dado de curiosidade é que a
diretora só aparece de costas para uma câmara de vigilância instalada em seu
escritório, de onde conversa com o Dirceu por meio do Skype. Com isso ela faz
piada com um dos conceitos mais marcantes do chamado cinema verdade que é o de
que a câmara deveria permanecer, como uma mosca na parede, sem interferir em seu
objeto. Aliás, este não é um filme sobre Dirceu, mas para ele,
como diz o título. Porque o seu tema é, na verdade, o próprio filme.
Neste
ano, a maioria dos títulos em competição no 45º
Festival de Brasília vem de Pernambuco. Um jornalista comentou que, se de fato esse festival for uma amostra no nosso cinema atual, poderíamos supor que o cinema
brasileiro seja agora majoritariamente pernambucano. Nos últimos anos o cinema
daquele estado tem sido marcado por filmes agitados e violentos, no trabalho de
gente como Paulo Caldas, Lírio Ferreira, Claudio Assis e Heitor Dahlia. Mas os
novos realizadores estão nos oferecendo a alternativa de modalidades mais
intimistas, com dramas mais interiorizados. É o caso do cativante do “Eles
Voltam”, do recifense Marcelo Lordello. Um carro para numa estrada e dois irmãos, uma moça de 12 anos e um rapaz de 15,
são deixados ali sozinhos. (foto abaixo)
As horas passam sem que os pais voltem para apanhá-los. O garoto se desespera e manda que a irmã o espere enquanto ele vai ao posto mais próximo. Nada acontece e ela passa a noite à beira da estrada. No dia seguinte um menino que passa de bicicleta a leva para a casa de sua família, dentro de um assentamento de “sem-terras” instalado na região. Assim se inicia a saga daquela menina de classe média alta que passa a experimentar coisas e conhecer pessoas que nunca tinha imaginado e que a transformariam por completo. O que mais impressiona no filme de Lordello (de costas abaixo) é a elegância e a discrição com que tudo é narrado, com uma coerência de estilo só vista em grande mestres do passado, como Antonioni, ou do presente como a argentina Lucrecia Martel.
As horas passam sem que os pais voltem para apanhá-los. O garoto se desespera e manda que a irmã o espere enquanto ele vai ao posto mais próximo. Nada acontece e ela passa a noite à beira da estrada. No dia seguinte um menino que passa de bicicleta a leva para a casa de sua família, dentro de um assentamento de “sem-terras” instalado na região. Assim se inicia a saga daquela menina de classe média alta que passa a experimentar coisas e conhecer pessoas que nunca tinha imaginado e que a transformariam por completo. O que mais impressiona no filme de Lordello (de costas abaixo) é a elegância e a discrição com que tudo é narrado, com uma coerência de estilo só vista em grande mestres do passado, como Antonioni, ou do presente como a argentina Lucrecia Martel.
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