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sexta-feira, 20 de março de 2015

Por enquanto, o melhor filme brasileiro de 2015 é "A História da Eternidade"


As primeiras imagens do pernambucano “A História da Eternidade” reforçam o paradoxo contido no título, ou seja, o que é histórico não pode ser eterno. O autor Claudio Cavalcante focaliza um enterro e o mostra do começo ao fim, desde que o cortejo entra em quadro e até a derradeira pá de terra ser lançada sobre o caixão. Ali nada há o que contar. Nenhuma história, apenas o inevitável retorno da matéria viva ao pó da terra.

https://www.youtube.com/watch?v=8TEuLkC7I68


Quando a lente revela a máscara de dor de Marcélia Cartaxo, porem surge a certeza de que há de fato uma ou várias histórias para acontecer naquele fim de mundo nordestino. Um lugar em tudo semelhante à desolação da paisagem escolhida para ambientar “Deus e o Diabo na Terra do Sol”. O clássico de Glauber Rocha, inclusive é citado por tabela, neste filme em que o sertão, literalmente, se transforma no mar. 

https://www.youtube.com/watch?v=GJzXp1ql0rc

O principal e mais contundente conflito do roteiro não acontece entre as classes sociais, mas entre dois irmãos, ou seja, entre o vaqueiro tosco e amargurado e um artista frenético que não se deixa abater nem pela miséria mais extrema. Esses são os papéis que Claudio Jaborandy e Irandhir Santos desempenham, com garra e precisão. 

 
https://www.youtube.com/watch?v=w8TlznTbbQ4
Do outro lado da praça, aliás a única da vila, por meio da sanfona, um cego se declara a uma mulher ainda incapaz de enxergar a força daquele amor. A fotografia de Beto Martins se junta à inspiradíssima música do imortal Dominguinhos e do polonês Zbigniew Preisner, para transformar aquela aridez em poesia pura. 
https://www.youtube.com/watch?v=f6Gb1c8tIqk


“A História da Eternidade” abre uma nova vertente no cinema brasileiro, agora tão sobrecarregado de comédias chulas e épicos sanguinolentos. Ou melhor, uma vereda atemporal, já trilhada por tantos outros cineastas brasileiros – de Mario Peixoto a Joel Pizini. É o retorno ao chamado “cinema de poesia”, tal como foi definido por Pier Paolo Pasolini. Para saud-alo nada como os acordes eternos d Dominguinhos.

https://www.youtube.com/watch?v=w8TlznTbbQ4 




Premiada no Oscar e em Cannes, as três faces Juliane Moore em cartaz na cidade


Nesta semana, é possível admirar o trabalho de Juliane Moore em três filmes absolutamente diversos: o drama realista e de certa forma exemplar, que é “Para sempre Alice”, filme que deu a ela o Oscar de melhor atriz. E o conto de fadas “O Sétimo Filho”, no qual ela interpreta uma bruxa má – muito mais inquietante e ambígua do que aquela outra criada por Angelina Jolie em “Malévola”. Na foto ela contracena com Robert Pattinson no filme "Mapas para as Estrelas", de David Cronenberg.

Em “Para sempre Alice”, assistimos às mudanças gradativas e radicais no comportamento e na aparência de uma intelectual que desenvolve precocemente o mal de Alzheimer. Para isso, ela deve ter empregado as técnicas de atuação propostas por Stanislavski e que, desde os anos de 1930, representam o feijão com arroz da arte dramática posterior ao Actors Studio. De modo simplificado trata-se de internalizar os conflitos do personagem para que eles se manifestem, digamos... naturalmente no corpo do ator.
Já no papel de bruxa, com a figura talhada pela maquiagem e outros efeitos especiais, ela se mostra ora decrépita e monstruosa, ora escultural e sedutora. Para exercer esse papel duplo, ela utiliza recursos exteriores ao seu próprio psiquismo, trabalhando na linha dos chamados “intérpretes característicos” de Hollywood – como, por exemplo, Lon Chaney que fez “O Corcunda de Notre Dame” e “O Fantasma da Ópera”.

A partir deste semana, porém, ela estará mostrando uma terceira faceta de sua arte, no filme “Mapas para as Estrelas” de David Cronemberg. No papel de uma estrela de cinema neurótica e amoral, Juliane exercita a paródia e uma caricatura da sua profissão. Critica a sua própria construção da personagem, por meio daquilo que Bertolt Brecht chamava de “afastamento”, ou seja, um trabalho capaz de impedir, ou pelo menos, dificultar a identificação afetiva entre ela e o público.
Parabéns a essa atriz que, aos 55 anos, continua desabrochando em seu ofício.



quinta-feira, 19 de março de 2015

A alegria de um cinéfilo que fazia filmes: José Wilker é o vilão de "O Duelo", agora em cartaz


Aproveitamos o sorriso de José Wilker para retomar, com o máximo de  alegria, a atividade deste blog endereçado aos que são, como ele era, amantes do cinema. 
O trabalho na Rádio e na TV Cultura, que mantive enquanto concluía a minha tese de doutorado na Unicamp, explica porque fui levado a interromper a edição regular do blog "Cinema Falado". Felizmente, a partir de hoje ele foi reativado, com uma matéria sobre os filmes que estreiam nesta semana. Caso raro neste período, são lançados quatro títulos nacionais. Mas não se trata de uma luz no fim do túnel, porque ao mesmo tempo outros sete estrangeiros chegam aos cinemas. Entre eles o medíocre blockbuster "Insurgente", que deverá atrair milhares de incautos. Abrindo espaço para experiências amadorísticas como "Branco Sai Preto Fica" (na foto abaixo), alguns colegas da mídia impressa alimentam a ilusão de que esse cinema auto-denominado "alternativo" e "questionador" venha a atrair a atenção do grande público, apenas por ser exibido no circuito comercial. Obras muitíssimo mais importantes, como "O Som ao Redor" e "A Historia da Eternidade" permanecem praticamente ignoradas. Esses quatro filmes novos nacionais também são comentados na página seguinte. A imagem que abre esta nota mostra a alegria de José Wilker em "O Duelo", o seu derradeiro trabalho no cinema. A ele, todo o nosso respeito por ter lutado pelo cinema brasileiro da melhor forma que lhe foi possível.  
    

quarta-feira, 18 de março de 2015

Quatro filmes brasileiros estreiam em 19 de março: infelizmente nenhum se salva

Nesta semana são lançados quatro filmes brasileiros, mas, infelizmente dotados de poucos pontos positivos. Digo isso apesar da competência dos atores e dos técnicos que trabalharam neles e que, visivelmente, se esforçaram para fazer o melhor possível. Já pronto desde 2012, Meus dois Amores é uma comédia regional e de época baseada em conto de Guimarães Rosa. Foi produzida pela Globo Filmes, com um elenco de primeira, que inclui Lima Duarte, Alexandre Borges, Caio Blat e Maria Flor. Toda falada em sotaque do interior de Minas, a trama é de difícil entendimento, principalmente pela fragilidade do roteiro que mistura tramas confusas e inconsistentes.
Na pele de um coronel, Lima Duarte está perfeito. Aliás, ele estaria bem, mesmo que não lhe dessem personagem algum. Por outro lado, Guilherme Weber e Milton Gonçalves se acham completamente deslocados. O pior é que um dos dois amores do protagonista Caio Blat é Maria Flor, enquanto o outro é uma mula, com a qual ele dorme toda noite... de conchinha

Decepção maior ainda é O Duelo, com direção de Marcos Jorge que, em 2007 nos deu o excelente Estomago. O roteiro se baseia no livro “Velhos Marinheiros” de Jorge Amado e traz o habilidoso ator português Joaquim De Almeida, além de Jose Wilker e Claudia Raia. Nenhum deles está bem, porque faltou o mais importante: roteiro e cuidado de produção.

Não há unidade nos figurinos e nem na ambientação de época. O livro foi escrito em 1961, a partir de referências que Jorge Amado trazia de muito antes. Mas tudo se passa num presente totalmente implausível. Verdadeiramente uma pena pelo desperdício de talentos.

Insubordinados é um trabalho de Edu Felistoque e da atriz Silvia Lourenço, colaborando aqui também como roteirista, filmado em elegante branco e preto. Na verdade esse longa é uma remontagem de trechos do seriado “Bipolar”, do mesmo diretor e já exibido na televisão.
Na verdade acrescentou-se a trechos de capítulos da série, um material filmado posteriormente e criado por Silvia Lourenço. Essas novas imagens contam uma pequena história dentro da qual se encaixa a ação contida no episódio
.
Uma tenente da PM interpretada pela Silvia vem passando as noites num hospital, onde seu pai se acha em estado de coma. Com o objetivo de passar melhor o tempo, ela começa a escrever um livro policial que corresponde exatamente às peripécias centrais do seriado. (foto abaixo)
O problema, porém, é o vazio que habita essa sequencia da moça que escreve um texto de ficção, enquanto aguarda a morte do pai. Nessa espera nada acontece de interessante e a vemos vagando pelos corredores, batendo papo com o faxineiro e conversando com a médica sobre o texto em processo de elaboração. Poderia ser uma experiência estética de confronto entre dois discursos ficcionais. Mas tudo não passa de tempo perdido.


Para facilitar a produção, mas dificultado a clareza da narrativa, a atriz Silvia Lourenço desenvolve dois personagens neste Insubordinados. Com cabelos longos, ela faz a tenente que é escritora nas horas vagas. Já de cabelos curtos, ela interpreta uma delegada especialmente agressiva, acompanhada por dois parceiros não menos violentos. Para complicar, a líder dessa equipe policial é interpretada por Priscila Alpha (foto acima) -- aliás, a mesma atriz que faz o papel da médica que atende o pai da Silvia, na outra história. Deu pra entender?

Branco Sai, Preto Fica foi o mais importante vencedor do Festival de Brasília de 2014, onde – além de melhor filme, arrebatou outros 10 prêmios. Se alguém estiver achando esse resultado um exagero, acertou. Mesmo que, naquela competição os de ficção filmes apresentassem uma qualidade muito baixa. Tanto assim, que o júri popular escolheu como melhor filme o documentário Sem Pena, sobre o nosso sistema carcerário.

É possível que a comissão julgadora tenha se impressionado pelo fato do filme ter sido feito por um coletivo recrutado em Ceilândia, uma das cidades satélite do Distrito Federal. Ou seja, trata-se de uma produção em cooperativa, na qual não houve financiamento. Ao contrário, os associados cuidaram eles mesmos da sua feitura e realizaram uma vaquinha para pagar os serviços técnicos mais complicados. 

O diretor e líder dessa associação é Adirley Queirós (foto acima). Dos 16 aos 25 anos, ele foi jogador de futebol profissional, mas estudou cinema na Universidade de Brasília, onde se formou há 10 anos. Branco Sai, Preto Fica é um filme ficcional que poderia ser considerado como de ficção científica, porque fala de um rapaz que foi baleado num baile funk e que volta ao passado para investigar o crime.

O roteiro poderia ter sido um justificado filme de protesto contra os problemas urbanos na periferia do DF que, aliás, não devem ser poucos. Mas resultou numa espécie de brado de guerra de Ceilândia contra Brasília – retratada como o antro da burguesia branca e opressora e que mereceria ser eliminada por meio de uma bomba. Pior do que essa postura ofensiva, que escandalizou muitos artistas e intelectuais brasilienses, a maior parte do filme é mesmo rudimentar e no fundo só interessa a quem o fez. 

"Mapas para as Estrelas" é o mais recente (e fascinante) escândalo de David Cronenberg


Como a maioria dos filmes do canadense David Cronemberg, Mapas para as Estrelas provoca impacto. Do elenco participam o veterano John Cusack e os jovens astros Mia Wasikowska e Robert Pattinson, além dessa atriz que vemos também em cartaz na cidade em Para Sempre Alice e O Sétimo Filho. Juliane Moore não é a protagonista do filme, mas é a personagem mais emblemática deste drama que tem como tema o desvario, a insanidade social e psíquica que domina aquele lugar. 

Hollywood é a sede de uma indústria em que as pessoas são meros insumos na produção de mercadorias. Gente de carne e osso que está para os filmes assim como os chips estão para os computadores fabricados no Vale do Silício.


Atualmente a cidade anda mais comportada, mas os escândalos de Hollywood já renderam milhares de páginas em jornais sensacionalistas. Isso desde os anos 1930. Por exemplo, com os processos judiciais contra Chaplin, o produtor Paul Bern que se matou por ciúmes de Jean Harlow, o assassinato de Natalie Wood pelo marido Robert Wagner (foto abaixo) e o misterioso enforcamento de David Carradine – só pra citar alguns casos, em centenas de ocorrências escabrosas.

O núcleo do enredo de Mapas para as Estrelas é uma família de celebridades hollywoodianas em que o filho de 13 anos é um astro de filmes para adolescentes que já consome drogas pesadas e enfrenta a própria decadência no sistema de estrelas. Já o pai é uma espécie de guru dos artistas, alguém que ganha dinheiro explorando as suas neuroses e fobias. As coisas se complicam quando a filha -- incendiária sai do hospício e tenta voltar para casa que ela tinha tentado queimar alguns anos antes. Em suma, Cronemberg nos revela o lado B do cinema americano. 

Filmes lançados em São Paulo na semana iniciada em19 de março de 2015

Novamente, o mercado de cinema pega fogo, oferecendo uma quantidade de lançamentos bem maior do que ele é capaz de absorver. Alguns títulos, portanto, estão desde já fadados ao esquecimento. Principalmente quando um novo blockbuster desponta no horizonte das estreias.
Da serie Divergente, temos o segundo episódio, chamado Insurgente. Essa é uma série de ficção científica especialmente banal, requentando mais uma vez a temática de “O Admirável Mundo Novo”, apresentada por Aldous Huxley há 83 anos. É também dirigida pelo alemão Robert Schwentke, que era considerado um profissional promissor, antes de entrar nessa linha de produção.

No extremo oposto, temos uma amostra atual do cinema alemão de verdade. É o elegante docudrama histórico Duas Irmãs, Uma Paixão – que vem a ser Friedrich Schiller que, ao lado de Goethe, foi o maior escritor da Alemanha do século XVIII. Quem dirige é o veterano Dominik Graf -- um dos mais premiados do cinema germânico
A mais atraente estreia da semana, no entanto, é Mapas para as Estrelas, outra obra impactante de David Cronenberg. O elenco tem Mia Wasikowska, John Cusack e Robert Pattinson. Porém, a grande figura é Juliane Moore em mais uma atuação memorável que, aliás, já mencionamos na semana passada. Trata-se de uma fábula cruel sobre o universo hollywoodiano, a partir ótica dos extravagantes conflitos entre artistas, agentes e diretores de cinema. Conflitos que podem ser sangrentos e mortais, como eram aqueles do velho oeste.
Por falar em faroeste, outra indicação é Divida De Honra: um filme pequeno, mas muito interessante, dirigido e protagonizado por Tommy Lee Jones que, em 1993 ganhou, o Oscar de coadjuvante por O Fugitivo. É um western muito original em que Hillary Swank tenta levar de volta para casa três mulheres de pioneiros que enlouqueceram no oeste. Em 2014, este filme concorreu à Palma de Ouro em Cannes.

Temos ainda una comédia romântica, inglesa e bem picante. Simplesmente Acontece conta a historia de um jovem casal que se conhece, namora e briga desde os 5 anos de idade.
Há também Eden -- um docudrama sobre Paul Valée, um DJ francês que criou a música eletrônica continental na década de 1990. Além desses 7 também estreiam quatro filmes brasileiros. Essa versão de Lenine para a canção de Milton Nascimento é uma das coisas boas que um deles, o Meus dois Amores oferece. Os outros três são O Duelo, Insubordinados e Branco sai, preto fica. 

quarta-feira, 14 de maio de 2014

Em "O Passado", Asghard Farhadi levanta antecedentes dos personagens sem "flash backs"

Mais do que uma simples história, O Passado de Asghard Farhadi é um ensaio sobre a memória, a consciência moral e a própria linguagem do cinema. Ao contrário do seu trabalho anterior -- A Separação, premiado com o Oscar, que operava na urgência do presente, se debruçando para as múltiplas possibilidades do futuro. Enquanto A Separação se desenrolava à beira de um rompimento familiar prestes a ocorrer ainda no Iran, O Passado se passa com parte de uma família já vivendo na França.
O filme se inicia com o marido voltando a Paris para oficializar o seu divórcio, porque a mulher que lá ficara com as filhas precisa se casar novamente. Ela é interpretada pela fotogênica e talentosa Berenice Bejo, esposa do diretor Michel Hazanavicius, com quem tinha feito o premiado O Artista. Meio que sem querer, esse quase ex-marido acaba descobrindo fatos extremante constrangedores a respeito do novo relacionamento da mulher.
A essência estrutural do roteiro é a opção por evitar o flash back. De modo que tudo o que tinha acontecido antes do início do filme precisa ser revelado, debatido e julgado nas cenas que passam naquele curto período em que o divórcio é assinado. Em outras palavras, o passado só pode se manifestar no presente, o que desafia a habilidade narrativa do diretor, mas amplia dramaticamente a sensação de vida real vibrando de verdade diante de nós. O Passado: outra grande obra de Asghard Farhadi, o lado mais vivo do cinema iraniano.

O PASSADO
Irã, França, 131min, 12 anos
estreia 08 05 2014
gênero drama/ família
Direção Asghard Farhadi
Distribuidor Califórnia Filmes
Com Bérénice Bejo, Tahar Rahim e Ali Mosaffa
COTAÇÃO
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Ó T I M O