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quarta-feira, 24 de outubro de 2012

“Gonzaga, de pai pra filho”: para o grande público e para plateias mais exigentes.


Mais do que a dupla biografia de dois artistas, “Gonzaga, de pai pra filho”, o filme de Breno Silveira (“Dois filhos de Francisco”) é um drama sobre o tumultuado relacionamento entre pai e filho – quase uma especialidade desse diretor que recentemente abordou temática semelhante em “À beira do caminho”. Esse conflito entre Gonzaguinha e “Gonzagão”, aliás, mostra-se também representativo de um choque entre gerações e até entre tendências musicais. Nas décadas de 1940 e 1950, o “rei do baião” transformou radicalmente a música popular brasileira e tornou-se um ídolo do rádio e dos filmes musicais. 
Quem se destacou na época dos festivais, no entanto, por meio de uma canção comprometida com a problemática da juventude e considerada “de protesto” foi seu filho Gonzaguinha. Nessa época, o velho sanfoneiro vivia uma fase de ostracismo e não reconhecia e nem aceitava a arte do filho, que considerava “coisa de comunista”. Existia nesse aspecto, inclusive, uma desavença de cunho claramente ideológico, mas que tinha origem no abandono sofrido pelo filho durante a maior parte da sua existência. Foram dez anos trancado num colégio interno, o resto da juventude morando com uma madrinha no Morro de São Carlos e, durante a vida inteira, a sombra de uma humilhação: Gonzaga era estéril e, por isso, sempre duvidou que fosse o pai biológico do menino. 
Sabiamente, porém, o roteiro não toma partido e mostra com generosidade as razões de cada um dos lados. Quem lucra com isso é o público que ganha um espetáculo cheio de música, humor e fortes cargas de emoção. Além de grandes interpretações, como a de Claudio Jaborandy fazendo o velho Januário e de Julio Trindade encarnando Gonzaguinha de corpo e alma. Já o velho Luis ficou a cargo de três atores diferentes – um deles, o Chambinho do Acordeon é músico de verdade e ajudou a recriar o clima do baião em seu início, quando foi formatado por Gonzaga e Humberto Teixeira. Há nesse ponto uma curiosa similaridade com o abismo que separava esse letrista autor de “Asa Branca” e sua filha, a atriz Denise Dumont, tal como vimos no documentário “O Homem que engarrafava Nuvens”, do qual ela foi produtora. 
Mesmo com a voz um pouco mais aguda do que a do personagem real, Chambinho dá conta do recado, principalmente nos números musicais, que acabam funcionando como atrações à parte – especialmente “Que nem Jiló” e “Respeita Januário”, esse um dos grandes momentos do filme. Nele tudo funciona, com destaque para a direção de arte de Claudio Amaral Peixoto, que deu vida a paisagens tão distintas como o sertão pernambucano dos anos 1930, a era de ouro do rádio, no Rio de Janeiro dos anos 1950, e a favela do morro de São Carlos nos anos 1970. E para a fotografia de Adrian Teijido, que se harmonizou com as imagens de arquivo tão bem integradas à narrativa pela montagem de Vicente Kubrusly. Neste filme diversas pontas ficam finalmente amarradas: o nordeste e o sul do país; os mundos rural e urbano; folclore e cultura pop; melodrama e comédia; a narrativa social e a intimista; enfim, cinema para o grande público, mas também para as plateias mais exigentes.

GONZAGA DE PAI PRA FILHO 

Brasil, 2012, 130 min, 12 anos
estreia 26 10 2012

gênero musical/ drama/ história

Distribuição Downtown Filme, Paris
Direção Breno Silveira 
Com Júlio Trindade, Chambinho do Acordeon, 
Claudio Jaborandy, João Miguel

COTAÇÃO
* * * *

Ó T I M O

Um comentário:

Cristiano Contreiras disse...

Luciano, quero primeiramente lhe parabenizar pelo espaço lúcido, inteligente e bem interessante sobre a arte do cinema. Eu estou te lendo, aos poucos, mas já gostei do que vi e percebi.

Vou te adicionar ao meu hall de blogs amigos, certo? gostaria de um melhor contato e troca cinéfila. Abraço