Parece uma orquestra andando e tocando ao mesmo tempo. Mas é apenas o acordeão de Dominguinhos, produzindo todos os efeitos de ritmo, harmonia e fraseado melódico que um único instrumento pode oferecer. Esse é apenas o começo de um documentário musical, em que a sanfona e a música popular brasileira são os temas principais. A arte de músicos como Sivuca e Borghetinho estão no primeiro plano.
Ao contrário do que acontece nos filmes de ficção, não é necessário que os personagens de documentário carreguem uma ação dramática. Mas é essencial que eles possam partilhar conosco esse milagre de presenciar uma mesma experiência real. Por mais que a música interpretada diante da máquina de filmar já esteja escrita e ensaiada, cada execução de uma peça musical é única inteiramente original. É isso que faz a força desse novo gênero em que cada tomada é ao mesmo tempo encenada, como no documentário clássico, e necessariamente imprevisível, como no cinema-verdade.
Neste trabalho de Sérgio Roizenblit, Dominguinhos é o guia de uma viagem em que visitamos todos os maiores sanfoneiros do país, em seus ambientes naturais e humanos. O ponto de partida é o mundo de Luiz Gonzaga e a devoção pernambucana à Santa Luzia, em cujo dia 13 de dezembro ele nasceu. Dia de um antigo ritual descrito como tragédia por Patativa do Assaré, também personagem do filme. Na verdade, este documentário opera sucessivos milagres de encantamento poético e transe musical, cada um deles equivalente à magia cinematográfica conjurada por mestres do documentário, como Jean Rouch.
gênero documentário musical
Brasil 2008 104 min
Distribuição Miração Filmes
Direção de Sergio Roisenblit
Com Dominguinhos, Sivuca, Patativa do Assaré,
Borguetinho, Mario Zan, Oswaldinho

Mas o essencial na produção do mal estar que o filme causa se encontra na dimensão formal, especificamente na montagem. Assim como fez Stanley Kubrick, inicialmente Von Trier oferece ao espectador uma certeza que vai se dissolvendo no decorrer do enredo. Isso numa atmosfera visual sombria e angustiante, como nas novelas góticas de May Shelley, Bram Stocker e Edgar Poe. “Anticristo” não usa computação gráfica, mas vai fundo na construção do horror, na linha de F.F. Coppola, em “Drácula” (1992).
Anticristo Antichrist
No meio do cotidiano, surge um drama de proporção pequena, que quase ninguém percebe. A não ser talvez a mãe do protagonista, que desconfia de uma coisa muito perigosa acontecendo com o filho. Ele, Joaquin Phoenix e ela Isabela Rosselini, interpretando pessoas de classe média no bairro nova-iorquino do Brooklin. Com quase 40 anos, ele ainda mora com os pais e volta e meia tenta se matar, porque há alguns anos perdera a mulher que amava. Apenas esse fato nos leva a duvidar da aparência de equilíbrio em suas emoções. Mas fora isso, é uma pessoa até simpática e bem humorada, ainda que apenas superficialmente. Só nós os espectadores sabemos que, para ele, a vida não tem mais sentido.
Quando o acaso lhe oferece uma espécie de bilhete premiado, ela tenta jogar fora, mas não consegue. Porque, além de rica, bonita e sensual, a moça que se apaixona por ele é de uma família que pretende incluí-lo como herdeiro. Mas como advertia Carlos Drumonnd de Andrade, é quase impossível enfrentar “o sem sentido apelo do não”. E assim, só para negar a sua própria natureza, esse herói às avessas se entrega a uma paixão completamente fora de hora e lugar por uma vizinha interpretada por Gwyneth Paltrow: a mais completa reunião de inconvenientes que uma moça pode oferecer. Neste que é dos filmes mais inquietantes do ano, o diretor John Gray (“Fuga Para Odessa” – 1994) mostra que o pior dos nossos inimigos pode estar escondido dentro gente.






Estreia também "Amantes", um drama psicológico extremamente perspicaz, muito bem escrito e dirigido por John Gray (“Fuga Para Odessa” – 1994) com Joaquin Phoenix no papel central, ao lado de Gwyneth Paltrow e Ninessa Shaw. Desde já podemos dizer que este pode ser um dos melhores deste ano naquele gênero. O tema central é um personagem que Milton Nascimento reconheria como "um caçador de si mesmo".
Agora quem quiser dar risada, pode ir sem susto ver "Os Normais 2", com Fernanda Torres e Luis Fernando Guimarães, claro, e mais Claudia Raia, Drica Moraes, Claudia Raia etc. É como se fosse um dos episódios da dupla na TV, só que mais longo e mais engraçado. A temática é um pouco mais apimentada do que a telinha permitiria, com os normais procurando viabilizar um menage à trois.
Mas, sem dúvida o grande espetáculo da semana, daqueles que lavam a alma, é um documentário: "O Milagre de Santa Luzia", sobre os sanfoneiros de todo o Brasil. O Dominguinhos nos apresenta a arte de mestres como Sivuca, Borguetinho (abaixo), Mario Zan, Oswaldinho e muitos mais. Imperdível!

Estréia também o segundo colocado naquele festival, a comédia romântica uruguaia “O Gigante”, sobre o segurança de um supermercado que se apaixona por uma faxineira, por meio das câmaras de vigilância instaladas na loja. Dois filmes latinos premiados estreando ao mesmo tempo fazem desta semana um caso raro.
Outro que dá para assistir, é a comédia adolescente francesa “Rindo a toa”, dirigida por Liza Azuelos, filha da atriz Marie Laforet, que foi uma das musas da nouvelle vague. Além desses três, os demais talvez não compensem sair de casa. Ainda mais agora que é possível pedir um DVD como se pede uma pizza. Ou até alugar arquivos digitais de vídeo que chegam, via internet, direto para o nosso computador. A Saraiva é a primeira a operar o sistema, implantado há poucas semanas, no Brasil. Basta escolher os filmes no site da Livraria, pagar, e baixar o filme Depois que o usuário o executa pela primeira vez, ele tem 24 ou 48 horas para assistir quantas vezes quiser. Ao fim desse prazo o arquivo fica bloqueado pelo sistema. O problema vai ser que filme escolher dentre os 650 títulos disponíveis no site.

O principal problema de Sofia Coppola não é ter abordado somente o lado mundano dos monarcas. Mas o de ser igualmente superficial ao comentar a Revolução Francesa que transformou radicalmente a história mundial no século XVIII. A participação da França na guerra de Independência do EUA ao lado dos americanos, por exemplo, é reduzida a uma mera aventura do rei. Já a etiqueta da corte é vista pela entediada rainha como “uma mania ridícula”, mesmo sendo um dos pilares do sistema político da monarquia.
O cinema de Roberto Rosselini mostra isso em "A Tomada do Poder por Luis XIV" (1966), o primeiro que ele realizou para a RAI, que infelizmente ainda não temos em DVD. (foto acima) Era um verdadeiro "docudrama", curiosamente contemporâneo à experiência de Peter Watkins na BBC, com "Culloden" (1964), considerado um marco inicial desse gênero que se situa a meio caminho entre a ficção eo documentário. (foto abaixo) Como vemos, a televisão pública foi o ventre que gerou os dois rebentos quase ao mesmo tempo: um na Inglaterra, outro na Itália. 


José Eduardo Belmonte nasceu em São Paulo, mas cresceu e se formou no Distrito Federal. Em seu filme "A Concepção", de 2006, ele retratou em profundidade o ambiente cultural de Brasília. E fez isso por meio de personagens jovens, mesmo porque a cidade tinha apenas 45 anos de idade. Este último filme já se passa em São Paulo, mas ele permanece focalizando aquela mesma faixa etária, com algumas diferenças. No trabalho anterior, os protagonistas eram da elite, filhos de diplomatas sempre fora do país e que enlouqueciam por falta de identidade social e referências éticas.
Neste, os personagens centrais também são jovens, só que massacrados pelo achatamento da classe social a que pertencem: um jornalista sem vínculo empregatício (Cauã Reymond), um motorista de taxi sem veículo próprio (João Miguel) e uma menina da noite que faz a ponte entre eles e a marginalidade (Caroline Abras). É um filme sobre o desespero e os efeitos que ele pode causar, realizado numa linha estilística de baixo orçamento, com equipe reduzida, filmagem em locação e iluminação natural. Um aspecto importante do roteiro é a conexão disso tudo com a corrupção na política e demais esferas da vida pública. Aguardamos o lançamento em DVD deste trabalho tão importante, um dos melhores de 2009.


Radicalmente gay e despudorado, na busca de espaços na mídia, ele ignora toda e qualquer regra de compostura. Esse esquema narrativo permite desenvolver a linha de trabalho sempre politicamente incorreta de Sacha Baron Cohen que consiste em colocar o personagem em confronto com gente comum. A graça é obtida a partir do espanto dessas vítimas que julgam estar lidando com alguém de verdade e não com uma figura de comédia. Nesse sentido e, se esses cidadãos estivessem de fato iludidos, estaríamos diante de um gênero que mistura humorismo e documentário. A foto acima se refere à cena mais engraçada do filme: um programa de TV, tipo Oprah, em que Bruno leva o garoto que adotara como filho, para imitar as demais celebridades de Hollywood.
Mas, diferentemente do que vemos em “Borat”, algumas dessas pessoas são famosas, como Paula Abdul, Elton John, Harrison Ford, além dos cantores Sting e Bono Vox. E isso leva a supor que as desconhecidas também estejam recebendo cachê. Em resumo aquilo que, em “Borat, era uma novidade absoluta, parece se transformar agora em algum tipo de maneirismo. 

A começar pela personagem do título, os personagens não tem consistência e são mal construídos. Como o da competente Melissa Leo, que vimos em “Rio Congelado” (2008). A clínica psiquiátrica em que a suicida se acha internada ora é apresentado como um lugar elegante, em que os internos têm um piano de cauda à disposição; ora é mostrado como um hospício comum, em que os as pessoas são tratadas com violência e drogas pesadas. O personagem do garoto com quem a suicida se envolve e por causa de quem ela volta a ter interesse pela vida é tão primário que os roteiristas o deixam mudo durante o filme todo, economizando o trabalho de escrever falas para ele. Além de tudo, o personagem principal não é a paciente Veronika, mas o médico que cuida dela. O enredo se resume ao relato de uma terapia, em que o psiquiatra é o único elemento ativo.
Veronica decide Morrer
Ao fim da 2ª Guerra, um polonês interpretado por Dan Stulbach chega ao Brasil, eufórico e falando português. Como é que pode? Nesse ponto já se abre a oportunidade para a criação de personagens especialmente concebidos para o filme; Como o preso político interpretado pelo próprio Daniel Fillho e um policial que estranha o fato e comenta com o chefe: um especialista em soltar a língua de presos políticos vivido por Toni Ramos. Com o abrandamento da ditadura Vargas, durante a qual fora bastante ativo, este torturador se acha meio encostado na alfândega, porém, com a incumbência de ficar de olho na possível chegada de um foragido nazista.
O polonês torna-se suspeito, ao declarar-se “agricultor”ainda que não apresente calos nas mãos. Desde o início, a propósito, Dan Stulbach interpreta num tom acima do que seria adequado para a lente do cinema. Segue-se o longo diálogo que consiste na peça original e que tem como desfecho uma homenagem à profissão de ator -- que é, aliás, o que salva o imigrante de um triste destino. Mas, este personagem se mostra mais consistente que o de Toni Ramos que, na adaptação para o cinema, não ganhou motivação suficiente para fundamentar a sua conduta de inquisidor. É que o roteiro do filme foi escrito pelo próprio autor da peça, sem o necessário apoio de um roteirista de cinema.

Falando em desespero, esse é também o mote da nova comédia do inglês Sacha Baron Cohen, que fez “Borat”. Trata-se de “Bruno” (acima), apresentador de um programa austríaco de TV cai em desgraça na Europa e vem procurar trabalho em Los Angeles. Radicalmente gay e despudorado, na busca de espaços na mídia, ele ignora toda e qualquer regra de compostura.
E também com a crise imobiliária como pano de fundo uma quase comédia de horror, “Arraste-me para o Inferno" (acima), de Sam Raimi que fez o já clássico “A Morte do Demônio” em 81. Uma gerente de banco não aceita o atraso na prestação no financiamento da casa de uma bruxa e, em troca recebe, uma maldição.Qualquer um desses dá pra assistir, menos o “Veronika Decide Morrer” baseado em livro de Paulo Coelho. (abaixo) 